LIVRO “O USO DO PORTFÓLIO NO ENSINO SUPERIOR”

Benigna Maria de Freitas Villas Boas

Acabo de receber o livro “O uso do portfólio no ensino superior”, de Márcia Ambrósio, publicado pela editora Vozes, 2013. Tive a honra de escrever um dos prefácios. Isso mesmo. São três: um escrito pela professora Maria Isabel da Cunha, outro pela professora Ângela Imaculada L. de F. Dalben e o outro por mim. O livro resulta da tese de doutorado da Márcia. As três professoras que prefaciam o livro compuseram sua banca de defesa de tese. A professora Ângela Dalben foi sua orientadora. Transcrevo o prefácio de minha autoria.
“A pesquisa e a tese de doutorado que originaram este livro partem da seguinte questão: quais conhecimentos e significados os docentes e discentes constroem em sala de aula quando vivenciam a construção de portfólios de aprendizagens num contexto de relação pedagógica dialógica e participativa? Desta questão retiram-se três palavras-chave: portfólio, relação dialógica e relação participativa. Percebe-se, assim, que esta produção se integra às que não se dedicam a denunciar as mazelas educacionais. Ao contrário, aponta possibilidades para que o trabalho da sala de aula se renove por meio de dois princípios fundamentais: a criatividade e a autoavaliação.

Márcia ousou ao enfrentar essa empreitada, apesar das resistências iniciais dos estudantes. Mas não perdeu o ânimo. Apoiou-se no trabalho com o portfólio, que requer criatividade pelo professor e pelos estudantes. Mitjáns Martinez (Criatividade, personalidade e educação. Campinas, SP: Papirus, 1997) nos ensina que o ato criativo possui duas características essenciais: a novidade e o valor em um determinado campo da ação humana. O uso do portfólio como novidade não pode ser entendido como modismo. A novidade significa fugir à mesmice e, no caso da avaliação, dos procedimentos previsíveis e que visam somente à atribuição de notas. Foi o que Márcia fez: aceitou experimentar o processo transitório de substituir a mesmice da relação pedagógica e do formato avaliativo acadêmico pelo complexo processo didático presente na construção de portfólios de aprendizagem. Essa é uma das qualidades da sua obra.

Causa espanto o depoimento de uma das estudantes de um curso de licenciatura: “Até então a faculdade não havia me dado esta oportunidade. Perdi minha criatividade e entusiasmo. Literalmente, adoeci. Perco um pouco da minha história no momento em que entro em uma sala de aula, não sou mais a Marina, sou mais uma aluna. Os professores não fazem questão nem de perguntar o meu nome, não faz diferença ali”. A estudante reclama do fato de nunca ter tido a oportunidade de construir um portfólio. Para ela, ser uma aluna significa fazer o que todos fazem, ao mesmo tempo e do mesmo jeito, sem nome. É o oposto do que se espera de um curso de formação de profissionais da educação.

O portfólio faz parte da prática pedagógica que valoriza a criatividade expressa na organização do trabalho pedagógico pelo professor e pelos estudantes. Nesse contexto a estudante Marina não manifestaria tanto descontentamento e tanta angústia. Sorte dela que passou a vivenciar um processo em que a sensibilidade da Márcia favoreceu as aprendizagens de todos os estudantes por meio de um recurso pedagógico que permite aos estudantes: se apresentarem, inserirem suas produções e destacarem as que lhes são mais significativas; incluírem suas análises, percepções, seus sentimentos e suas escolhas; apreciarem continuamente o processo de aprendizagem; reconhecerem a autenticidade do trabalho porque todas as suas etapas são expostas e analisadas; produzirem reflexões sobre o uso do portfólio em sua futura área de atuação; terem o seu trabalho e o dos educadores valorizado porque é posto à mostra. O trabalho com o portfólio pode revolucionar as práticas pedagógicas principalmente nos cursos de formação de profissionais da educação, tão impregnados de formatos ultrapassados. Contudo, cabe deixar claro: o trabalho com o portfólio não é o “remédio para todos os males”. O seu valor se encontra no fato de desvelar o contexto ao qual se vincula.

Para que, segundo a Márcia, o portfólio seja um recurso dinamizador da avaliação ao estabelecer um forte vínculo entre diagnóstico, processo e produto, colocando a avaliação em todas as situações de interação professor-aluno, permitindo também que o estudante regule seus processos de pensamento e aprendizagem, além da criatividade, outro princípio está sempre presente: a autoavaliação pelo estudante. Este é um dos maiores facilitadores da avaliação formativa nas escolas de educação básica e superior. Márcia declara: “Os estudantes eram estimulados a elaborar suas atividades e nunca descartá-las. O refazer numa 1ª, 2ª, 3ª versão etc. revelava o crescimento acadêmico de cada estudante e diante do processo iam sendo capazes de se autoavaliar e demonstrar suas aprendizagens. Destarte, os documentos analisados e que compunham os portfólios eram trabalhos que já haviam sido lidos pela professora e devolvidos com apreciações para a sua finalização e/ou clareamento de ideias presentes no texto, mas interrompida e/ou pouco delineada”.

Eis uma das virtudes do portfólio: todas as produções discentes ficam registradas e podem ser apreciadas a qualquer momento e por diferentes pessoas. Ele revela a trajetória de aprendizagens dos estudantes. Além disso, desmistifica o entendimento de estudantes e professores que deixar registradas as atividades ainda incipientes e frágeis desvaloriza o trabalho. Assim pensam os adeptos da avaliação classificatória. Não é o que quer a avaliação formativa: ela deseja que os estudantes tenham clareza do que já aprenderem e do que lhes falta aprender para que eles próprios tracem seus objetivos. Assim se forma para a autonomia intelectual.

O grande mérito da obra da Márcia é apresentar a teoria e a prática do portfólio por meio de pesquisa conduzida junto a estudantes de cursos de licenciatura, futuros profissionais da educação. Cerca de 450 estudantes construíram seus portfólios. Resistiram, a princípio. Reclamaram. Expuseram seus medos e inseguranças. Por fim, confiaram na proposta da Márcia. Disso tudo resultou este trabalho maravilhoso”. Benigna Villas Boas

 

14 respostas para “LIVRO “O USO DO PORTFÓLIO NO ENSINO SUPERIOR””

  1. Benigna,
    Agradeço pela honra deste prefácio tão signifcante. Sua dedicação à educação são exemplos que carrego na minha docência. Obrigada!
    Márcia Ambrósio

     
  2. Os professores que participaram da referida pesquisa, certamente, desenvolveram um olhar diferenciado sobre o sentido da avaliação e sua grande influencia no processo ensino-aprendizagem. Tal experiência impulsionará a construção de novas maneiras, pelos futuros educadores, de levarem seus alunos a entenderem o percurso do seu próprio aprendizado. Seria maravilhoso que essa iniciativa fosse abraçada por muitas instituições de ensino superior, não apenas em cursos de licenciatura, mas em muitas outras áreas.
    Dedico-me ao estudo da Criatividade no contexto escolar e a leitura de tal obra certamente contribuirá em meus estudos.
    Abraços,
    Edileusa

     
    1. Certamente, Edileuza. Vale a pena ler o livro da Márcia Ambrósio. Como você sabe, a criatividade é um dos princípios do trabalho com o portfólio.
      Abs,
      Benigna Villas Boas

       
  3. Edileusa,

    Fico feliz em encontrar meus pares nesta discussão. Tenho o trabalho da Professsora Benigna como inspiração e gostaria de conhecer suas produções. Certamente seu trabalho trará uma discussão importante para sustentar as práticas que venho desenvolvendo atualmente no ambiente virtual de aprendizagem.
    Aguardo um e-mail seu: marciaambrosio@oi.com.br
    Abraços,
    Márcia Ambrósio

     
    1. Edileuza, entre em contato com a Márcia Ambrósio. Ela é professora na Universidade Federal de Ouro Preto.
      Abs,
      Benigna Villas Boas

       
    2. Querida Márcia, eu também fico feliz em poder partilhar ideias e aprofundar conhecimentos sobre temas tão relevantes para a área da educação. Entrarei em contato com você.
      Abraços.

       
  4. Professora Benigna,

    Seu trabalho esta na vanguarda das transformações acadêmicas. Obrigada por ensinar por meio de suas pesquisas e experiências inovadoras. Você é uma referência, com certeza! Aprendo com sua prática, com seus livros e com sua humildade pedagpogica.

    Um abraço,
    Márcia Ambrósio

     
    1. Obrigada, Márcia. Aprendemos por meio da interação que estabelecemos com os colegas.
      Abs,
      Benigna Villas Boas

       
  5. Benigna,

    O lançamento do livro na Igreja Nossa Senhora do Amparo (Chalé/MG).

    Foi nesta paróquia ” que na adolescência, vivi a esperança de poder mudar o mundo. Em meio ao trabalho como catequista, primeiro com crianças, depois com adolescentes, jovens e adultos, já empunhava uma luta conscientizadora/libertadora por meio da religião – usando como fontes teóricas e práticas a teologia da libertação de Leonardo Boff […].(REZENDE, 2010, p.70)

    […] Entre a adolescência e a juventude vivida, me desenvolvi lendo Leonardo Boff, Frei Betto, seguindo as orientações da terceira Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano realizada em Puebla de los Angeles, no México, em 1979, que tinha como princípios evangelizar por meio de pastorais e das CEBs. Os objetivos principais desse trabalho eram reconhecer uma sociedade em transformação, evangelizar tendo a opção pelos pobres, para libertação, comunhão e participação do homem em sua vida social, visando a construção de uma sociedade fraterna (PUEBLA, 1979). Experienciando ações libertadoras, via um mundo de possibilidades, em que a igreja focasse, em suas pregações e ações, os pobres e oprimidos, em que os partidos políticos de fato empunhassem em suas bandeiras a defesa das crianças, dos jovens e dos idosos deste País […].REZENDE, 2010, p.70).

    Veja texto completo no blog:

    http://portfoliodeaprendizagem.blogspot.com.br/p/lancamento-do-livro-e-agradecimentos-a.html

     
  6. Benigna,

    O lançamento do livro na Igreja Nossa Senhora do Amparo (Chalé/MG).

    Foi nesta paróquia ” que na adolescência, vivi a esperança de poder mudar o mundo. Em meio ao trabalho como catequista, primeiro com crianças, depois com adolescentes, jovens e adultos, já empunhava uma luta conscientizadora/libertadora por meio da religião – usando como fontes teóricas e práticas a teologia da libertação de Leonardo Boff […].(REZENDE, 2010, p.70)

    Veja texto completo no blog:

    http://portfoliodeaprendizagem.blogspot.com.br/p/lancamento-do-livro-e-agradecimentos-a.html

     
    1. Márcia, fica aqui registrado o lançamento do livro “O uso do portfólio no ensino superior” no blog. Parabéns! Sucesso em seu trabalho. Você é batalhadora.
      Abs,
      Benigna

       

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