POSICIONAMENTO DO GEPA QUANTO À VALIDAÇÃO DE AULAS REMOTAS COMO DIAS LETIVOS

A Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal validará o ensino remoto emergencial a partir do dia 13 de julho de 2020

A Secretaria de Educação do Distrito Federal (SEDF) anunciou que o DF retomará o calendário letivo de 2020 a partir do dia 13/07/2020, por meio do ensino remoto emergencial. Para terem acesso às aulas, os estudantes precisarão se cadastrar na plataforma Escola em Casa, para acessarem asala de aula virtual que opera por meio do Google Sala de Aula. Para aqueles que não possuem acesso à internet, uma parceria da TV Justiça com o Governo do Distrito Federal (GDF) levará o conteúdo até a casa dos estudantes pela televisão, em quatro canais diferentes, e no canal @Educadf disponível no Youtube.

As atividades pedagógicas de ensino remoto emergencial, síncronas ou assíncronas, serão consideradas como efetivo trabalho escolar e a carga horária trabalhada será utilizada para a substituição de carga horária presencial. Esta decisão converge com o estabelecido no parecer do Conselho Nacional de Educação nº 5/2020 e no Parecer do Conselho de Educação do DF, nº 33/2020, que conferem autonomia aos sistemas de ensino para ajustar suas organizações pedagógica, administrativa e calendário escolar, abrindo possibilidade para que as atividades não presenciais sejam computadas para fins de cumprimento de dias letivos.

É preciso registrar que, desde o início do isolamento social, medida adotada para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional, decorrente do novo Coronavírus responsável pelo surto de 2019 – COVID-19, professores de escolas públicas e privadas têm interagido com estudantes e suas famílias em busca de maneiras de darem prosseguimento aos trabalhos escolares. Há relatos exitosos, mostrando a capacidade dos professores de se reinventarem, restabelecendo a fundamental parceria entre escola e família. Por outro lado, há depoimentos de professores e estudantes que ficaram totalmente desassistidos, por diferentes razões.

 A Subsecretaria de Educação Básica, da SEDF, está encarregada de readequar o currículo em movimento para o ano letivo de 2020, em todos os componentes curriculares e anos/séries, visando garantir a articulação entre as ferramentas pedagógicas disponibilizadas – plataforma, teleaulas e material impresso. Compete aos professores a elaboração de atividades pedagógicas não presenciais, tanto para disponibilizá-las nas salas de aula virtuais, quanto para usá-las como material impresso destinado aos estudantes que não tiverem acesso às aulas. A frequência escolar será computada por meio da entrega, aos estudantes, das atividades on-line ou impressas. Reforça-se a necessidade de trabalho colaborativo e o efetivo acompanhamento das Regionais de Ensino.

Há ainda a orientação de que “as atividades a serem entregues até o fim de cada bimestre/semestre, para efeitos de verificação de frequência e de avaliação para as aprendizagens, deverão ter caráter interdisciplinar, apresentar dinâmicas desafiadoras e partir das práticas sociais dos estudantes” (Plano de Gestão Estratégica para a Realização das Atividades Pedagógicas Não Presenciais da Rede Pública de Ensino, p. 15). Para isso, a Subsecretaria de Formação Continuada dos Profissionais da Educação (EAPE) promoveu, durante as duas semanas que antecederam o início do calendário de aulas remotas, a formação de professores e outros profissionais da educação para desenvolverem as aulas remotas. Mais de vinte mil professores foram atendidos em diferentes cursos: GSuit (ferramentas do google para a educação), Produção de Material Didático e Moodle on-line.

Todo esse esforço é válido, porém, conseguirá se estender, com a mesma qualidade, a todos os estudantes matriculados na rede pública de ensino? Certamente, não! Portanto, se a educaçãoé direito de todos, qualquer medida de segregação não pode ser aceita. Validar dias letivos, desconsiderando os milhares de estudantes que não conseguirão acompanhar as aulas remotas ou as atividades impressas, sendo, portanto, excluídos, é uma iniciativa descabida.

O que revelam as pesquisas?

Os números da Pesquisa TIC Kids Online Brasil, sobre o uso da Internet por crianças e adolescentes no Brasil, realizada em 2018, revelam que, entre crianças e adolescentes de 9 a 17 anos, 66% não se conectam à Internet em ambientes privados, seja na própria residência ou na residência de amigos e familiares. Além disso, esse número atinge 82% dos/as estudantes na zona rural, 70% entre os das classes D e E; 67% entre os da classe C e 58% entre os das classes A e B.

As pesquisas do PNAD (2018) indicam outros dados relevantes e que precisam ser considerados, especialmente quando se defende o ensino a distância ou mesmo remoto, em caráter emergencial. Entre eles, destacamos: 17,3% das crianças de 0 a 14 anos moram em residências que não têm acesso à rede geral de abastecimento de água e 40,8%, em locais sem conexão com o sistema de esgoto. Nas casas em que não há internet, as condições de saneamento são ainda piores: 29,3% sem rede de água e 60% sem esgoto. A Pnad mostraainda, que 15,1% das residências abrigam seis ou mais pessoas e, em 40%, há mais de três moradores por dormitório. Os computadores portáteis continuam concentrados nas famílias mais ricas: na classe A, 90% têm notebook e 49%, tablet. Nas camadas D e E, os índices são de 3% e 4%, respectivamente. As diferenças, portanto, são assustadoras.

Ademais, uma pesquisa do Instituto Península, realizada entre os dias 13 de abril e 14 de maio de 2020, entrevistou 7.734 docentes de todo o país e concluiu que 83% deles ainda se sentem despreparados para ensinar a distância.

De acordo com o Blog da Boitempo, “mais da metade dos estudantes da rede básica do estado de São Paulo, dentre os 3 milhões e meio de matriculados, nunca acessou e nem deu login no sistema de aulas online montado para a continuidade pedagógica durante a pandemia. A muitos deles faltam tecnologia e infraestrutura mais básica do que conexão e aparelhos eletrônicos, como saneamento básico, alimentação e o mínimo necessário para sobreviver a uma crise sanitária”. Se essa é a realidade da maior cidade do Brasil, a situação é ainda pior em cidades e municípios das regiões Norte e do Nordeste.

Recente pesquisa realizada pelo Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF) indica números estarrecedores para a capital do Brasil: 26,27% dos 460 mil estudantes da rede pública de ensino do DF não têm condições materiais de assistirem e participarem de nenhum tipo de Educação a Distância (EaD). Isso significa que a adoção de EaD ou aulas remotas, neste período de pandemia, excluirá da educação mais de 25% dos estudantes.

Posicionamento do GEPA

Levando em conta as considerações anteriormente apresentadas, o Grupo de Pesquisa Avaliação e Organização do Trabalho Pedagógico – GEPA –  se posiciona contrariamente ao cômputo das atividades remotas na recomposição do calendário letivo, ao mesmo tempo em que se mantém firme na defesa da educação pública de qualidade social e contra qualquer iniciativa que conduza a desigualdades de acesso às aprendizagens.

Compreender a organização do trabalho pedagógico no ensino remoto, proposto por diferentes sistemas e redes de ensino, nos remete a pensar sobre a relação intrínseca entre objetivos e avaliação. Ambos atuam em conjunto. A avaliação fornece elementos para iniciar o trabalho pedagógico, para garantir sua continuidade ou sua reorganização em atendimento aos objetivos previamente estabelecidos e outros surgidos enquanto ele se concretiza.

No caso do ensino remoto em desenvolvimento nas escolas públicas do DF, interessa-nos saber qual é a real finalidade do processo avaliativo: contribuir para a construção das aprendizagens ou comprovar a não aprendizagem, já que os que não puderem acompanhar o trabalho remoto não terão direito às aprendizagens?  

A realização de atividades sem a devida mediação pedagógica e acompanhamento sistemático de professores pode ser um recurso utilizado na tentativa de diminuir os impactos da pandemia. Entretanto, a validação dessas atividades como dia letivo potencializará a exclusão dos estudantes sem condições de acompanharem as aulas remotas, o que aumentará as desigualdades educacionais. Além disso, ampliará as possibilidades de avaliação informal negativa. Sem condições de mediar o ensino, pais e familiares podem reforçar avaliações desencorajadoras, contribuindo para um clima tenso e desanimador para os filhos/estudantes.    

O ensino remoto, na presente situação, corre o risco de não atender a um dos princípios básicos do trabalho pedagógico: a salutar relação pedagógica que se estabelece entre os estudantes e entre estes e os professores. A falta de interação empobrece o ensino e a avaliação. Perpetua-se a velha lógica:  conteúdo dado, conteúdo cumprido.

A máxima que vem sendo difundida: “a escola precisa se reinventar” ou “o professor/a precisa se reinventar” precisa ser vista com cautela. Estamos em período de crise sanitária. Não vamos usar esse momento para banalizar ou simplificar o trabalho escolar.

Portanto, não há pontos e contrapontos. Temos um país com imenso abismo social e um pobre investimento em educação. Neste momento de enormes sacrifícios, precisamos de ter cuidado com a cultura do “oportunismo”. Não precisamos de Estado mínimo! Ao contrário, queremos mais ações sociais e um Estado que consiga de fato alcançar quem mais necessita. As escolas não precisam de pacotes tecnológicos, mas de recursos, valorização da carreira docente e gestão pública comprometida com a construção de uma educação de qualidade social.

O que pode ser feito? Pensando em alternativas

Diante da situação de calamidade pública que vivemos, o GEPA entende que o número de dias letivos só pode ser considerado a partir do retorno às atividades presenciais, o que exigirá a integração dos anos letivos de 2020 e 2021.

E como fazer com os estudantes do 3º ano do Ensino Médio, os concluintes da Educação de Jovens e Adultos e os da Educação Profissional? Excepcionalmente, para estes grupos, a SEDF poderá complementar o ensino remoto emergencial com atividades síncronas e interativas, desde que providencie as devidas condições de acesso para todos.

E as demais etapas e modalidades da educação básica? Terão a reposição de forma gradativa. Para isso, indicamos que a organização curricular seja revista. Um “currículo de transição” (SILVA, 2020) organizado pelo coletivo escolar, considerando as especificidades de cada escola, reúne chances de que sua implementação se dê de maneira exitosa. Propostas integradoras e interdisciplinares são muito bem-vindas. Há tempo defendemos que o “ensino em caixinhas”, com foco no conteúdo, tem que ser superado. Não seria esse o momento de tornar real esse propósito?

E como ficam os professores nesse período? Várias iniciativas podem ser incentivadas, assim como o efetivo e contínuo investimento na sua formação, mas sem torná-la obrigatória nem usá-la como dia letivo.

Escolas e professores podem estabelecer contato com estudantes e famílias para apoiar esse momento tão singular que estamos vivendo. Atividades podem ser realizadas e mediadas quando possível, com o uso de diferentes recursos. Tudo isso por meio de um planejamento cuidadoso e de muita atenção à saúde mental de crianças, jovens e adultos, não aumentando a ansiedade e a pressão propondo excesso de atividades.

Por último, recomendamos que, neste momento de enfrentamento da pandemia do coronavírus, não seja esquecida a autonomia pedagógica das escolas e dos seus docentes e que as ações das equipes gestoras sejam sempre respaldadas pela participação de professores, estudantes e seus pais/responsáveis.

Referências: 

BLOG DA BOITEMPO. O trabalho de educar numa sociedade sem futuro.Disponível em < https://blogdaboitempo.com.br/2020/06/05/o-trabalho-de-educar-numa-sociedade-sem-futuro/ > Acesso em 05 de junho de 2020.

CARLA, Maria. Mais de 120 mil estudantes da escola pública do DF não conseguem acessar a EaD. SINPRO-DF, 2020. Disponível em:  https://www.sinprodf.org.br/mais-de-100-mil-estudantes-da-escola-publica-do-df-nao-conseguem-ter-acesso-a-ead/>. Acesso em 01 de junho de 2020.

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO – CNE. Parecer nº 5, de 28 de abril de 2020. DOU. 28/04/2020. Categoria: Especial Coronavírus.

GDF. SEEDF. Plano de Validação das Atividades Pedagógicas não presenciais. Brasília, 2020. Disponível em: <http://www.se.df.gov.br/wp-conteudo/uploads/2020/06/Plano_de_Validacao_das_Atividades_Pedagogicas_nao_Presenciais_versão final.pdf>. Acesso em 15 de junho de 2020.

SILVA, Francisco Thiago. Currículo de Transição: uma saída para a educação pós pandemia. Revista EDUCAmazônia – Educação Sociedade e Meio Ambiente, Humaitá. Ano 13, Vol XXV, Núm 1, Jan-Jun, 2020, pág. 70-77.

TENENTE, Luiza. 30% dos domicílios no Brasil não têm acesso à internet; veja números que mostram dificuldades no ensino a distância. G1, 26/05/2020. Disponível em: <

https://g1.globo.com/educacao/noticia/2020/05/26/66percent-dos-brasileiros-de-9-a-17-anos-nao-acessam-a-internet-em-ca sa-veja-numeros-que-mostram-dificuldades-no-ensino-a-distancia.ghtml>. Acesso em 26 de maio de 2020.

 

Nota técnica sobre o trabalho em plataformas virtuais

“Nota Técnica para a atuação do Ministério Público do Trabalho na defesa da saúde e demais direitos fundamentais de professoras e professores quanto ao trabalho por meio de plataformas virtuais e/ou em home office durante o período da pandemia da doença infecciosa COVID-19.”

Baixe a NOTA TÉCNICA – GT COVID 19 – 11/2020 aqui.

 

Contribuições do GEPA sobre o processo avaliativo durante a pandemia

Contribuições do GEPA – Grupo de Pesquisa Avaliação e Organização do Trabalho Pedagógico –  sobre o processo avaliativo durante a pandemia

A avaliação é o componente do trabalho pedagógico presente em todas as situações de aprendizagem. Ela fornece elementos para iniciá-lo, para garantir sua continuidade ou sua reorganização, em atendimento aos objetivos traçados, em função de novos objetivos surgidos durante o processo. Avaliação e objetivos estão sempre entrelaçados.

Todas as decisões do trabalho pedagógico são tomadas com o auxílio da avaliação. Daí sua essencialidade. Não estamos falando da que classifica, por meio de notas e de rótulos impostos aos estudantes e que se interessa apenas pela aprovação e reprovação. Ocupamo-nos da que se compromete com as aprendizagens de todos os estudantes, isto é, da avaliação formativa. Esta é a avaliação para as aprendizagens e não somente das aprendizagens. A palavra “para” indica o movimento característico da avaliação, em busca de avanços. Já a palavra “aprendizagens”, no plural, sinaliza que todas as situações a que os estudantes se expõem, em todos os ambientes escolares, constituem aprendizagem e não somente as decorrentes dos conteúdos curriculares. Se aprendemos em diferentes situações, o mesmo acontece com a avaliação.

O Brasil é um país imenso e com muitas desigualdades sociais. Quando o coronavírus se espalhou entre nós, o ano letivo, que mal havia se iniciado, foi interrompido. A partir de então, um grupo de estudantes passou a desenvolver atividades online e outro não, por motivos vários, dentre eles a falta de condições de escolas de se organizarem para esse formato pedagógico e a inexistência de ferramentas tecnológicas pelas famílias. Como se pode perceber, as desigualdades educacionais serão ampliadas em função desse problema sanitário que estamos enfrentando.

Um outro fator de desigualdade poderá ser acrescido se usarmos online o velho e rançoso processo avaliativo, com foco em provas e notas. Se ainda não conseguimos praticar a avaliação em benefício das aprendizagens de todos os estudantes quando com eles interagimos pessoalmente, essa dificuldade poderá ser maior quando trabalhamos remotamente. Será impossível desenvolvermos a avaliação formativa em aulas remotas?

Se não nos é possível olhar o estudante, admirar suas manifestações corporais, tão necessárias para estabelecermos relacionamento seguro e necessário, enfim, se não nos é possível observá-lo, como de costume, podemos criar atividades que nos forneçam informações úteis. Por exemplo: diários de aula, reflexões, cartas, desenhos, histórias, análises, projetos, propostas em geral, sempre de acordo com sua idade, o tema da atividade e interesse. Essas aulas poderão ser documentadas pelos estudantes, de várias formas. Será uma oportunidade valiosa para o desenvolvimento da escrita e o aprofundamento de aprendizagens impulsionadas pelo período da quarentena. Mas, calma! O professor não terá de ler e analisar as produções dos estudantes para dar nota. Esta figura punitiva da avaliação não deverá ser usada. Se a nota for realmente necessária, como infelizmente é, deixemos para resolver isso quando houver o retorno às aulas. Quem sabe a experiência com a pandemia não nos inspira para construirmos o processo avaliativo condizente com a formação dos estudantes para a participação, responsabilidade e autoria?

E provas serão necessárias? Também não. Os estudantes poderão “provar” que estão aprendendo por outros meios, como os acima sugeridos. Se estamos vivendo uma situação excepcional e tentando dar continuidade ao trabalho escolar, por que não reinventarmos o processo avaliativo? Por que não inserirmos os estudantes e seus pais/responsáveis na construção da avaliação que faça sentido para todos?       

 

Sobrecarga de atividades atinge alunos e docentes e expõe lacunas do ensino remotoJC

JC Notícias – 22/06/2020

21. Sobrecarga de atividades atinge alunos e docentes e expõe lacunas do ensino remoto

  • Dificuldades de acesso e adaptação das avaliações criaram cenário de incerteza na rede pública de SP

Passados quase dois meses desde o início das aulas a distância para alunos da rede pública de ensino de São Paulo, estudantes afirmam estarem sobrecarregados com as atividades enviadas pelos professores. Muitos demonstram falta de motivação para seguir os estudos devido às incertezas provocadas pela pandemia do novo coronavírus.

A situação dos docentes não é diferente. O distanciamento do ambiente escolar exige dos professores mais tempo para o preparo das aulas e atividades, correções e, sobretudo, para atendimento aos estudantes por meios eletrônicos.

Veja o texto na íntegra: Folha de S. Paulo

O Grupo Folha não autoriza a reprodução do seu conteúdo na íntegra. No entanto, é possível fazer um cadastro rápido que dá direito a um determinado número de acessos.

 

Nota técnica

Nota Técnica assinada pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, pelo Centro de Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (CEDECA-CE), pelo Grupo de Pesquisa “Direito à Educação, Políticas Educacionais e Escola” da Universidade Federal do ABC e pela Rede Escola Pública e Universidade (REPU) cobra ações democráticas

O documento apresenta informações e dados que devem ser considerados pelos gestores educacionais e solicitados às redes de ensino para o controle social das suas ações durante e após o período de isolamento, com vistas a garantir o direito humano à educação.

O documento orienta para que sejam consideradas as seguintes questões:  

Como foi reorganizado o calendário escolar? O que foi priorizado nessa decisão?

Como se deu a participação das comunidades escolares nas tomadas de decisão relacionadas à reorganização do calendário e à reposição das atividades presenciais?

Como as ações da rede de ensino (planos de ação, orientações, normas editadas) foram publicizadas para as comunidades escolares e o Conselho de Educação local?

Que parcerias foram coordenadas com outras secretarias de governo e entes federativos para organizar o trabalho durante e após o período de isolamento?

Foram feitas alterações em Regimentos Escolares ou Projetos Político-Pedagógicos? Essas mudanças foram deliberadas pelos Conselhos Escolares? Houve redimensionamento de expectativas e objetivos expressos nos currículos oficiais? Houve mudanças nos calendários das avaliações? Como isso foi debatido na rede de ensino?

Que providências foram tomadas pelas escolas para minimizar os impactos da medida sanitária de isolamento a estudantes e suas famílias?

Que atividades foram desenvolvidas no período de isolamento e qual o caráter dessas atividades: complementares ou para fins de cumprimento da carga horária obrigatória?

De que forma a rede garantiu as interações entre professores e estudantes e também entre as equipes escolares?

Atividades não presenciais:

Que meios ou processos foram adotados para a realização de atividades não presenciais na rede de ensino? Como estudantes e famílias acessaram as atividades?

Foram produzidos materiais didáticos novos? Como foram avaliados? Quem participou dos processos de produção e avaliação?

Que ferramentas de comunicação (aplicativos, plataformas, TVs e rádios públicas, etc.) foram adotadas para essas atividades? Elas são de desenvolvimento próprio? Se não, quem são os desenvolvedores/fornecedores?

Quantos estudantes e educadores da rede possuem acesso a tablets, smartphones ou computadores, bem como à conectividade necessária para a realização das atividades? Houve distribuição de equipamentos eletrônicos (notebooks, tablets) a estudantes e educadores da rede? Quantos e quais foram distribuídos, por unidade educacional?

Ações para o retorno às atividades presenciais:

Como foram definidos os critérios para a eventual validação de atividades não presenciais como atividades letivas oficiais na rede de ensino? Quem participou do processo decisório?

Quais os critérios para o registro da participação dos estudantes nas atividades não presenciais?

Como tem sido a inspeção das redes de ensino, tanto do ponto de vista da estrutura física quanto dos recursos humanos, a fim de atender os seus pedidos de validação de carga horária?

Qual o papel das escolas na elaboração de planos de reposição de atividades?

 

Posicionamento da Associação Brasileira de Alfabetização (ABAlf) sobre aulas remotas em tempos de pandemia

A Abalf chama a atenção para a necessidade de as redes de ensino, as escolas, os docentes e as famílias, conjuntamente, comprometerem-se com amplo debate sobre a garantia do efetivo direito de aprendizagem da leitura e da escrita das crianças, jovens, adultos e idosos durante e no pós-pandemia, como instrumento político que contribui para a inserção social e cultural de todas e todos como cidadãs e cidadãos.

A OMS e o Ministério da Saúde preveem um tempo longo de isolamento social, o que trará prejuízos para o ano escolar. Em vista disso, alguns estados e municípios estão implantando propostas de atividades remotas para a Educação Básica. Embora se entenda a responsabilidade e compromisso que estão envolvidos nessas ações, elas se apresentam um tanto açodadas e homogeneizantes, pela ânsia de minimizar possíveis prejuízos de um longo período sem atividades escolares, entende a Abalf. A Medida Provisória, editada pelo governo federal em 1º de abril do presente ano, ao permitir que escolas e redes de ensino não cumpram o mínimo legal de 200 dias letivos de aulas presenciais, mas mantenham a carga horária de 800 horas, dá margem para a ampliação de propostas de atividades remotas, mesmo que as redes e os estudantes não tenham condições para tal.

A Abalf alerta para o fato de que “essas ações/orientações deslocam para professores e famílias responsabilidade que é da administração dos sistemas educacionais, sejam eles públicos ou privados. Além disso, estratégias desse tipo requerem dos professores domínio de ferramentas de comunicação virtual e digital, de mídias específicas e suas linguagens, que não se resolvem meramente do ponto de vista técnico. O uso delas aplicado à Educação requer formação específica e aprofundada, sob risco de ampliar e agravar as disparidades já existentes no sistema Educacional do país”. A associação propõe para reflexão: “é preciso considerar que trabalho/aulas/atividades remotas, a dita “educação a distância”, requer tutores on-line, formação docente específica, plataformas on-line, material didático específico e público com conhecimento mínimo e condições de acesso a rede de Internet e dispositivos didáticos virtuais, o que não cabe nem na legislação nem nas realidades da maior parte dos alunos da Educação Básica no Brasil. A isso soma-se a etapa da alfabetização, que requer processo específico de interação constante entre professores e alunos, de modo que as ferramentas digitais apresentam limitação nesse sentido”.

A Abalf acrescenta suas preocupações: “1) como o docente irá planejar um ensino de emergência/remoto para as mais diversas realidades sociais de crianças, jovens, adultos e idosos, sobretudo àqueles cujo acesso à tecnologia inexiste ou é precário? 2) Como planejar e ressignificar as estratégias próprias de aulas presenciais, garantindo o acesso e a aprendizagem de todos? Alfabetizar exige afetividade, interação entre pares, jogos, brincadeiras, leituras, conversas, dramatizações, registros diversos, livros e outros materiais, portanto, como garantir que essas atividades ocorram de modo à distância? 3) Muitas dessas atividades, associadas às interações entre as crianças e entre as crianças e os professores, requerem a observação, participação complementação e intervenção dos professores, para se garantir e ampliar o processo de ensino e aprendizagem. Nesse sentido, a aula remota é um padrão que não permite este gerenciamento pedagógico e essa observação fundamental para se avançar no processo de alfabetização”.

A estas preocupações cabe acrescentar que, por estar em quarentena e supostamente em casa, a maioria dos pais está preocupada com a sua sobrevivência e que grande número deles não possui equipamentos eletrônicos, rede wifi, nem níveis de escolarização e letramento elementares. Além disso, “conduzir processos de ensino e didatizar saberes requerem formação específica, sendo de responsabilidade de professores”.

Finalmente, a quais grupos sociais tais ações beneficiarão?   

 

Blog do Freitas

Entrevista com Evaldo Piolli por Luiz Carlos de Freitas

O “Ideias de Esquerda” entrevistou Evaldo Piolli, especialista em gestão educacional, política educacional e trabalho docente e professor da Faculdade de Educação da UNICAMP. O tema cobriu políticas do MEC, o processo de privatização, o cenário da educação na pandemia e as perspectivas do financiamento da educação pública no país. Leia aqui.

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Luiz Carlos de Freitas | 08/06/2020 às 10:15 PM | Tags: Desqualificação professor, Pandemia, Plataformas de aprendizagem on line, Resistência, Vouchers | Categorias: Privatização, Weintraub no Ministério | URL: https://wp.me/p2YYSH-7h9

 

Resolução do FNDE/MEC institucionaliza a desigualdade educacional no Brasil

Cristhian Spindola Ferreira

Enquanto vivemos um contexto de pandemia, o FNDE/MEC altera marco regulatório da política educacional brasileira, apresentado no dia 14 de maio de 2020, em uma webconferência (https://www.youtube.com/watch?v=iQ1I74kPfBM), referente aos aspectos da Resolução nº 3, de 29 de abril de 2020, que estabelece os critérios para o apoio técnico e financeiro às redes públicas de educação básica dos estados, municípios e Distrito Federal, no âmbito do terceiro ciclo do Plano de Ações Articuladas (PAR).

De acordo com a resolução, o PAR é uma ferramenta de planejamento multidimensional e plurianual da política educacional disponibilizada aos municípios, estados e Distrito Federal, que tem por objetivo promover a melhoria da qualidade da educação básica pública, observadas as metas, diretrizes e estratégias do Plano Nacional de Educação, de que trata a Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014.

Nas disposições gerais da resolução, em seu Art. 3º, são estabelecidos os critérios para atendimento técnico e financeiro do PAR, dentre os quais destaca-se o item II, que estabelece prioridade de atendimento, do referido plano, às escolas com melhor desempenho no IDEB, em relação as metas projetadas pelo SAEB/INEP.

Desde a instituição do IDEB em 2007, as políticas educacionais de fomento financeiro utilizavam esse índice como parâmetro de atendimento; entretanto, a prioridade sempre eram as unidades da federação ou unidades escolares de menor IDEB, em busca de equidade educacional e social. Era uma perspectiva de inclusão educacional e de melhoria dos sistemas educacionais.

Com a alteração desse critério, o FNDE/MEC instaura um retrocesso na política educacional, pois tal perspectiva acirra as desigualdades educacionais brasileiras. Significa decretar que uma escola ou estado de baixo IDEB continuará apresentando dificuldades, sem condições materiais para estabelecer um projeto político-pedagógico que garanta a qualidade social da educação. Países como os Estados Unidos utilizam essa lógica perversa para o fechamento de unidades escolares e demissão de profissionais da educação.

Outro critério apresentado é a utilização do índice de distorção idade-série considerando os indicadores de eficiência e rendimento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP. Para esse critério não fica claro, na resolução, se são os melhores ou piores índices que serão determinados como prioritários.

Consolidando o retrocesso, o documento prevê que o FNDE/MEC constituirá um ranking (termo utilizado na referida resolução) com os estados e o Distrito Federal e outro com os municípios a serem atendidos pelo PAR, utilizando modelo estatístico que considere, no mínimo, os critérios do IDEB e índices de distorção idade-série. Com isso, observa-se a supremacia desses dados, em detrimento de outros critérios relevantes, como o indicador de vulnerabilidade socioeconômica presente no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Por fim, a referida resolução credita ao PAR um ideário que afronta as diretrizes de superação das desigualdades educacionais e de melhoria da qualidade da educação, presentes no atual Plano Nacional de Educação. Com essa norma, o MEC aprofunda os graves problemas educacionais, comprometendo a formação das futuras gerações de brasileiros, que impactam diretamente o desenvolvimento do país.

Link da resolução: https://www.fnde.gov.br/index.php/acesso-a-informacao/institucional/legislacao/item/13495-resolu%C3%A7%C3%A3o-n%C2%B0-03,-de-29-de-abril-de-2020   

 
Nora Krawczyk: falácias da EAD por Luiz Carlos de Freitas, blog do Freitas

“Com a suspensão de aulas presenciais por conta da atual pandemia, voltam com força redobrada as pressões pela implantação da Educação à Distância (EAD). As mentiras e falácias sobre esse tema se multiplicam.” Leia aqui em Carta Capital.

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Luiz Carlos de Freitas | 02/06/2020 às 10:30 AM | Tags: Desqualificação professor, Pandemia, Plataformas de aprendizagem on line, Resistência | Categorias: Assuntos gerais, Privatização | URL: https://wp.me/p2YYSH-7gL