Novo livro examina o fracasso da Base Comum americana


Novo livro examina o fracasso da Base Comum americana, por Luiz Carlos de Freitas
Um novo livro de Tom Loveless, “Between the State and the Schoolhouse: Understanding the Failure of Common Core,” será lançado em abril de 2021 pela Harvard Education Press. A introdução do livro pode ser lida aqui. Ele encontra-se em pré-venda na Amazon. O livro cujo título pode ser traduzido por  “Entre o Estado e a […]
Leia mais deste post Luiz Carlos de Freitas | 27/03/2021 às 11:04 AM | Categorias: Assuntos gerais | URL: https://wp.me/p2YYSH-7Fp Comente    Ver todos os comentários

 

Socioeducação e pandemia: a quantas anda o trabalho pedagógico?

Enílvia Rocha Morato Soares

            Se o período de pandemia motivado pela covid-19 trouxe prejuízos aos estudantes de uma maneira geral, o que dizer dos socioeducandos que, mesmo em tempos de normalidade, costumam ter suas atividades escolares prejudicadas, quando não negligenciadas, por fatores diversos, entre eles, pela falta de acesso a recursos tecnológicos que possibilitem enriquecer e diversificar os percursos pedagógicos, em atendimento às diferentes condições de aprendizagem.

Em virtude da necessidade de distanciamento social e, em decorrência, do afastamento dos professores de seus locais de trabalho, a aula remota foi o principal recurso adotado para dar prosseguimento às atividades escolares. Considerando que aos adolescentes e jovens em cumprimento de medida socioeducativa é vedado o acesso à internet, a opção foi pelo uso de atividades pedagógicas não presenciais para o ensino e cumprimento a carga horária mínima estabelecida.

Para auxiliar o encaminhamento dos trabalhos nos e pelos Núcleos de Ensino[1], a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF) elaborou, em parceria com a Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania do Distrito Federal (SEJUS), o Plano Pedagógico para realização de atividades não presenciais ou híbridas nos Núcleos de Ensino das Unidades de Internação Socioeducativas (GDF, 2020), com “a intenção de assegurar, com segurança, a escolarização na socioeducação durante o período de isolamento social provocado pela pandemia de COVID-19” (Idem, p. 8)

            Entre as diferentes orientações que constam no Plano Pedagógico, pode-se destacar a elaboração de Planos de Ação locais por Núcleo de Ensino, contendo calendário com informações sobre a periodicidade para a entrega e devolutiva de materiais, assim como nortear a construção desses materiais de modo a garantir a flexibilização dos processos avaliativos.

O documento também recomenda a organização de cronogramas semanais e alerta para a imprescindibilidade de que as atividades sejam oferecidas diariamente aos estudantes. Lembra ainda ser fundamental a constante interlocução entre os NUENs, as equipes gestoras das escolas vinculantes[2] e das unidades de internação, bem como entre os professores do Núcleo de Ensino por meio da coordenação pedagógica remota, utilizando-se de meios digitais e virtuais. A criação de canais que promovam a comunicação direta com as famílias, a fim de manter a interação entre estudantes e seus familiares é igualmente indicada pelo Plano Pedagógico.

Quanto à avaliação, o documento reitera o compromisso com os princípios da avaliação formativa, devendo o professor adotar diferentes estratégias de avaliação, visando facilitar as aprendizagens e ressignificar o protagonismo dos estudantes em seu processo de aprendizagem. Indica a utilização de portfólios, diários de bordo e relatos escritos pelos próprios estudantes como forma de autoavaliação.

Considerando que legislações, por si só, não garantem sua concretude, vale questionar: Como o Plano Pedagógico para realização de atividades não presenciais ou híbridas nos Núcleos de Ensino das Unidades de Internação Socioeducativas (GDF, 2020) está sendo implementado nos Núcleos de Ensino?

Pesquisa realizada em um Núcleo de Ensino de uma Unidade de Internação do DF (SOARES, 2020) antes do início da pandemia, ou seja, quando o trabalho pedagógico era organizado e desenvolvido presencialmente, reforça preocupações quando ao modo como o Plano Pedagógico está sendo materializado no âmbito dos Núcleos de Ensino. Irregularidades na operacionalização de orientações legais são apontadas no estudo, entre elas:

  1. Primazia dos horários das Unidades de Internação sobre os dos Núcleos de Ensino, evidenciando uma sobreposição das questões de cunho administrativo, em particular, da segurança, às atividades educativas e, em decorrência, uma dissonância entre o número de horas-aula previstas e trabalhadas nos Núcleos de Ensino.

Tá ótimo. A quantidade de aulas tá bom. Uma vez por semana tá bom. É a média aqui, né? (risos) Só devia melhorar mais aí as aulas de Educação Física porque nós devia praticar muito esporte. (estudante)

  • Desarticulação entre o Núcleo de Ensino e demais setores da Unidade de Internação, bem como escassez de Coordenações Pedagógicas intrassetorial (encontros entre coordenadores pedagógicos dos níveis central, intermediário e local), contrariando a política intersetorial prevista legalmente.

Não houve, mas essa intrasetorial ela é fundamental. […]  Nós sentimos essa necessidade de fazer mais reuniões mas aqui não acontece, entendeu? (Supervisor do Núcleo de Ensino)

Uma coisa que a gente já solicitou várias vezes, várias vezes, é que tenha pontos, canais de comunicação formalmente instituídos entre equipe pedagógica e escola. E não tem. Antigamente a gente tinha. (Pedagoga da Unidade de Internação)

  • Desconhecimento, pelas famílias dos estudantes, do trabalho desenvolvido no e pelo Núcleo de Ensino, contrariando o estabelecido legalmente quanto à necessidade de participação ativa da família e da comunidade na experiência socioeducativa. Depoimento informal proferido por uma mãe assegurou existirem familiares que sequer tinham ciência da existência de uma escola dentro da Unidade de Internação.
  • Predomínio de uma avaliação condescendente com o intuito de compensar os estudantes pela situação de clausura em que se encontravam, fortemente descolada do processo de ensino-aprendizagem e, em consequência, distanciada da prática avaliativa formativa defendida nos documentos orientadores do trabalho desenvolvido nas escolas da rede pública.

Tem praticamente… tem aluno que não faz nada. Professor pega e mete um 10. Ganha nota. Eu nunca vi ninguém reprovar em cadeia. Eu não sei explicar porquê. (estudante)

  • Avaliação centrada no professor em decorrência de descrédito quanto às condições dos estudantes para se autoavaliarem e aceita com naturalidade pelos estudantes, constituindo obstáculo a um ensino guiado pelo objetivo de promover a autonomia, conforme defendido nas diretrizes que tratam da avaliação.

Avaliação é um conceito de todos… um conceito do outro que tá acima a ter um conceito sobre nós que tá aqui embaixo. Por quem está acima dentro do estabelecido pela legislação. (estudante)

Os diferentes problemas que incidem sobre o trabalho presencial desenvolvido junto aos socioeducandos, associados às adversidades de uma pandemia, e à escassa atenção dada pela mídia e por grande parte dos gestores e estudiosos da educação, à escolarização desses adolescentes e jovens, acentuam as preocupações quanto ao modo como tem sido organizado e desenvolvido o trabalho pedagógico nos e pelos Núcleos de Ensino. Estaria sendo oferecida aos estudantes que ora se encontram em cumprimento de medida socioeducativa, uma educação escolar pautada pelo compromisso político de assegurar-lhes o inalienável e legítimo direito de aprender?

Referência

GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF). Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal. Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania do Distrito Federal. Plano Pedagógico para realização de atividades não presenciais ou híbridas nos Núcleos de Ensino das Unidades De Internação Socioeducativas. Brasília-DF, 2020.

SOARES, Enílvia Rocha Morato. Avaliação e socioeducação: desafios e perspectivas na escolarização de jovens em conflito com a lei. Curitiba: Apris, 2020.


[1] Nome dado às escolas onde estudam os adolescentes e jovens que se encontram em cumprimento de medida socioeducativa.

[2] A fim de impedir a identificação do adolescente a quem se atribua autoria por ato infracional, o que inclui a sua documentação escolar, os socioeducandos do DF são, oficialmente, matriculados em escolas regulares da rede pública de ensino do Distrito Federal, denominadas escolas vinculantes.

 

O “bônus” está de volta: mais dinheiro pelo ralo

Blog do Freitas, em 19/03/2021

Reportagem de Paulo Sandaña, na Folha de São Paulo, informa que o Ministério da Educação vai lançar um programa para as escolas dos anos finais do ensino fundamental, ou seja, do 6º ao 9º ano, que prevê assistência técnica e bonificação para aquelas que melhorem resultados de abandono, aprendizado e desigualdade. Leia aqui. A ideia […]

Leia mais deste post

Luiz Carlos de Freitas | 19/03/2021 às 10:07 AM | Tags: Bônus por mérito, Pagamento por Valor Agregado, política com evidência, Reformadores empresariais | Categorias: Avaliação de professores, Links para pesquisas, MEC sob Bolsonaro, Meritocracia, Pastor Milton no MEC, Privatização, Responsabilização/accountability | URL: https://wp.me/p2YYSH-7EF

 

Avaliação entre os estudantes: fortalecendo as práticas avaliativas

Erisevelton Silva Lima – Professor da SEEDF, Gestor Escolar e Doutor em Educação pela Universidade de Brasília- UnB.

Embora a descentralização da avaliação seja tabu para muitas instituições e diversos profissionais do campo educacional, trago para este espaço algumas reflexões sobre como se pode fazer uso de instrumentos e procedimentos avaliativos que auxiliem o estudante a aprender cada vez mais. De início, recomendo que pensemos no uso emancipador e fortalecedor da avaliação para crescimento pessoal e profissional daqueles que estão nas salas de aula, sejam elas virtuais ou presenciais. Também recomendo que nos livremos da ideia de controle extremo e do sentimento de uma suposta “perda” pela adoção da avaliação por pares ou por colegas em suas aulas.

Avaliar para as aprendizagens (VILLAS BOAS, 2014) se inscreve em lógicas diferentes daquelas utilizadas pela escola de cunho capitalista, ou seja, não se reduz o aprender à busca doentia pela garantia de pontos ou notas para “passar de ano”; avalia-se para aprender, para qualificar as produções e, sobretudo, para corrigir fluxos e caminhos que podem ser modificados antes das finalizações requeridas pelas avaliações classificatórias.

Colocar dois ou mais estudantes na situação de avaliadores das aprendizagens de seus colegas requer demovê-los de alguns sentidos e dos sentimentos historicamente acumulados em relação à avaliação, especialmente daqueles que reforçam a ideia de que se deve avaliar para dominar ou submeter o outro à nossa vontade. Aqui, o desejo é outro, altruísta diríamos, é o de uma avaliação formativa, aquela que desarma as pessoas e as valoriza sob a ética da contribuição e do auxílio ao próximo como um ato, verdadeiramente, humano e solidário. Partamos do pressuposto de que avaliar alguém é usar da generosidade para que esse outro melhore, cresça e progrida em seus propósitos. Sendo assim, a avaliação por pares requer estudo e reflexão com os estudantes antes de atribuir-lhes a tarefa. Trata-se de uma prática em que ambos ganham e aprendem, rompe-se com o isolacionismo, todos logram algo, positivamente (COSTA, 2017).

Outro ponto, não menos importante, é o da clareza dos objetivos pretendidos pelo docente com aquela atividade, tarefa ou trabalho. O grau de entendimento do que o professor espera precisa ser negociado e traduzido para os estudantes. A avaliação requer transparência. No quadro abaixo apresentam-se algumas questões que precisam ser consideradas para que a experiência seja exitosa:

ATIVIDADE OU TAREFA (PRESENCIAIS OU VIRTUAIS)METODOLOGIA
Elaboração de um texto, resumo, relatório ou outro tipo de produção. Solução de problemas, estudos de caso e outros.Solicita-se que a produção seja entregue para outro colega que irá, respeitosamente, apresentar suas impressões ou dúvidas surgidas com a apreciação da atividade. Elementos como os aspectos gramaticais, conceituais e outros podem ser anotados pelo colega numa folha ou suporte, à parte, para ser entregue ao autor da peça. Ambos podem ser convidados para dialogarem sobre os apontamentos, isso ajudará bastante. Elementos de forma também podem ser alvo dessa experiência avaliativa. Devem-se evitar trocas mútuas de atividades para que não haja vício ou negociação que prejudique a qualidade da avaliação realizada.
Apresentação de seminários (grupo) ou trabalhos individuais.Os objetivos de aprendizagem ou os critérios de avaliação devem ser esclarecidos. Se o docente optar pelo anonimato, todos preenchem um formulário no qual constarão os quesitos eleitos como importantes e, após a apresentação do trabalho, cada elemento do grupo ou o indivíduo receberá da turma suas impressões quanto aos assuntos referendados pelo docente com a turma.
Quadro elaborado pelo autor

Observem que tal estratégia potencializa a autoavaliação e, talvez, seja o elemento principal dessa trama porque coloca o sujeito diante da possibilidade de refletir sobre seu trabalho e sua produção (LIMA, 2013, 2017). A avaliação não deve ser cruel ou negativa, pode apontar pontos frágeis, mas também, as potencialidades contidas no trabalho avaliado.

REFERÊNCIAS

COSTA, Carla Barroso. Autoavaliação e avaliação pelos pares: uma análise de pesquisas internacionais recentes. Rev. Diálogo Educ., Curitiba, v. 17, n. 52, p. 431-453, abr./jun. 2017

LIMA, Erisevelton Silva. Avaliação por pares (colegas) e autoavaliação: procedimentos que encorajam e emancipam. In: TEIXEIRA, Célia Regina; MIRANDA, Joseval dos Reis; Avaliação das aprendizagens: experiências emancipatórias no ensino superior. Ed. Câmara Brasileira do Livro – SP, 2013. cap. 7, p. 141-160.

LIMA, Erisevelton Silva. Avaliação por colegas: Aprendendo a ser avaliador. In: Villas Boas, B. M de F. (org.) Avaliação: interações com o trabalho pedagógico. Campinas – SP. Papirus, 2017.

VILLAS BOAS, Benigna Maria de Freitas. Avaliação para aprendizagem na formação de professores. Cadernos de Educação, Brasília, n. 26, p. 57-77, jan./jun. 2014.