Na educação básica, oito em cada dez gestores são mulheres

JC Notícias – 27/02/2023

Pesquisa estatística do Inep mostra ainda que 11,4% dos dirigentes de escolas municipais passaram por processo seletivo qualificado; no caso dos estados, foram 28,7%, em 2022

Com base no Censo Escolar 2022, o Ministério da Educação (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) revelam o panorama de atuação de 2,3 milhões de professores e de 163 mil gestores da educação básica do país em cargos de direção. As estatísticas permitem avaliar se as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) estão sendo cumpridas. Dentre elas, a meta 19, que prevê “a gestão democrática das escolas associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar”.

O Censo Escolar mostra que a maioria expressiva que ocupa cargo de gestão tem formação superior (90%) e é composta por mulheres (80,7%). Apenas 11,4% das 162.847 pessoas em cargos de direção nas escolas da educação básica passaram por um processo seletivo qualificado antes de serem nomeadas pela gestão municipal.

Quando se trata dos estados, esse percentual é de 28,7%. A pesquisa revela, ainda, que 66,6% e 23,3% desses profissionais foram, exclusivamente, indicados pela gestão municipal e estadual, respectivamente. Já o acesso ao cargo por meio de concurso público ocorre em 7% dos casos de escolas municipais e em 11,3% das estaduais.

No que se refere a eleições com participação da comunidade escolar, o Censo mostra que 31,9% dos gestores passam por esse tipo de processo nos estados e 12,9%, nos municípios. Outros meios representam 2,1% das escolhas, no caso das escolas municipais, e 4,8%, das estaduais.

O ministro da Educação, Camilo Santana, pretende apresentar uma política nacional para alcançar as metas do PNE. “Faz parte de uma estratégia que alguns municípios e estados adotaram. São aspectos que precisam ser avaliados para que possamos construir uma política nacional, em regime de colaboração com os entes federados.”, analisou durante a coletiva de imprensa de apresentação dos dados do Censo Escolar.

O presidente do Inep, Manuel Palácios, destacou, na mesma ocasião, que “é a realização do Censo Escolar que permite o monitoramento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE), como é o caso da Meta 19, que prevê a gestão democrática das escolas associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública à comunidade escolar”.

Formação – o Censo também mostra que há desafios no que diz respeito à formação continuada de diretores, em gestão escolar. Ao todo, 19,3% possuem cursos desse tipo de especialização (com mínimo de 80 horas).

Na avaliação do diretor de Estatísticas Educacionais do Instituto, Carlos Eduardo Moreno, “trata-se de uma questão relevante que a pesquisa traz sobre essa figura, que é, de fato, muito importante no sentido de mobilizar todos os equipamentos e os recursos humanos em prol da qualidade, do desenvolvimento e das aprendizagens no ambiente escolar”.

Professores – já a meta 15 do PNE visa garantir que todos os professores da educação básica tenham formação específica de nível superior, obtida em curso de licenciatura, na área de conhecimento em que atuam. A partir de dados do Censo Escolar, o Inep elabora o indicador de adequação da formação docente. Esse índice sintetiza justamente a relação entre a formação inicial do professor e a disciplina que ele leciona.

Logo, os docentes são divididos em cinco grupos: com licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) na mesma área em que dá aula; com bacharelado na disciplina que ministra, mas sem licenciatura ou complemento pedagógico; com licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) em disciplina diferente daquela que leciona; formado em área que não faz parte da grade disciplinar da escola e sem formação superior.

Anos iniciais e finais – a pesquisa considerou a análise das seguintes matérias: língua estrangeira; ensino religioso; geografia; história; ciências; artes; matemática; língua portuguesa e educação física.

Do 1º ao 5º ano, mais de 70% dos professores possuem licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) na mesma área em que dão aula – o que é compreendido como a perfeita adequação entre a formação e a disciplina que leciona (as exceções, aqui, são os docentes de língua estrangeira). No caso dos educadores físicos, esse percentual é de 83,3%.

Do 6º ao 9º ano, a proporção de professores com o perfil mencionado anteriormente (tido como o mais adequado) também é maior em praticamente todas as disciplinas analisadas.

Entretanto, no caso de três áreas em específico esse percentual não chega a 50%. São elas: ensino religioso (10,8%), língua estrangeira (43,6%) e artes (48,6%). Nos anos finais, há uma ampliação no perfil com licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) em disciplina diferente da que leciona. Nesses casos, a concentração de profissionais formados em pedagogia é notória.

Ensino médio –foram avaliados os docentes das seguintes disciplinas: sociologia, língua estrangeira, filosofia, física, artes, química, língua portuguesa, geografia, história, matemática, biologia e educação física.

Nessa etapa educacional, o percentual de professores sem formação superior é menor em relação às demais etapas. Na maioria das disciplinas, a predominância é de perfis com licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) na mesma área em que dão aula.

Isso não ocorre somente com os docentes de sociologia e língua estrangeira. Nesse caso, a maior parte tem licenciatura (ou bacharelado com complementação pedagógica) em disciplina diferente da que leciona.

MEC

 

Abraços floridos de Vânia Leila

Enílvia Rocha Morato Soares

Com “abraços floridos” Vânia Leila se despedia de nós. Dessa vez não deu tempo. Ela se foi deixando um vazio sem tamanho, no GEPA… no mundo. 

Sua estada no plano terrestre deixou exemplos de humildade, solidariedade e alegria. Nos ensinava com gestos de carinho. Sua escuta sensível e suas lembranças preparadas com cuidado e dedicação nos comoviam, fazendo dela um ser único e especial.

Sua leveza e simplicidade não a impediam, no entanto, de encarar com força e determinação os desafios que a vida lhe impôs. Foi filha, mãe, avó, irmã, amiga, enfim, foi mulher guerreira. Enfrentou com coragem e bravura adversidades como um câncer durante o curso de mestrado. Nada a impedia de prosseguir aprendendo e ensinando, como é característico de educadores comprometidos. Mesmo depois de aposentada prosseguiu concluindo mais uma graduação e planos de partir para o doutorado.

Companheira de estudos, de sonhos e de luta por uma educação de qualidade social, fez de sua trajetória pessoal e profissional exemplos de coragem e compromisso com o bem público. Suas contribuições ao GEPA enriqueceram nossos encontros e produções; e às escolas foram motivo de orgulho para todo o Grupo.

Vânia irradiou luz por onde passou e certamente continuará assim na eternidade. Sempre esteve e para sempre estará presente entre nós. Abraços floridos, querida!

 

Avaliação informal entre os estudantes

Benigna Maria de Freitas Villas Boas

A avaliação informal não tem merecido a devida atenção por estudiosos em avaliação,  em suas publicações e apresentações, em que conferem mais espaço à formal. Quando a abordam, costumam referir-se à avaliação informal dos estudantes praticada por professores. Contudo, com frequência, os estudantes avaliam uns aos outros informalmente. Este é o tema deste texto. Inicialmente, analisemos as contribuições de Freitas et al  (2009), que nos dizem:

A parte mais dramática e relevante da avaliação se localiza aí, nos subterrâneos onde os juízos de valor ocorrem. Impenetráveis, eles regulam as relações tanto do professor para com o aluno, quanto do aluno para com o professor. Este jogo de representações vai construindo imagens e autoimagens que terminam interagindo com as decisões metodológicas que o professor implementa em sala de aula (p. 27).

Concluem os autores que este processo informal acontece de forma encoberta, sendo desvinculado da avaliação formal (p. 28). Por meio dele o professor toma decisões que afetam as aprendizagens dos estudantes. É tão poderoso que pode mudar o rumo do trabalho pedagógico. Percebe-se, então, a força de que se reveste essa modalidade avaliativa.  Em outro momento, os autores  afirmam que os “processos de avaliação informal terminam sendo mais relevantes no processo de exclusão” (p. 16), por induzirem a tratamento desigual aos estudantes que necessitam de mais apoio pedagógico. Até mesmo na organização escolar feita por progressão continuada ou por ciclos “o processo de avaliação informal se mantém intato, quando não valorizado” (p. 16), isto é, continua promovendo exclusão.

A avaliação informal é a que traça o destino dos alunos para o sucesso ou o fracasso, complementam os mesmos autores. O trabalho do professor em sala de aula, consciente ou inconscientemente, argumentam,  por ela se orienta. E o que é mais sério: “é nesta informalidade que se joga o destino das crianças mais pobres” (p. 28).

A lógica da exclusão da escola e/ou dos saberes se alia à da submissão, podendo ter a avaliação informal como aliada. É o que tem acontecido nas escolas cívico-militares. Por meio dessa aberração, os militares se encarregam da disciplina para que os professores possam cumprir o currículo. A lógica contrária é a da formação do “estudante-cidadão para a autonomia e para a auto-organização, para a intervenção na sociedade com vistas a torná-la mais justa, no sentido da eliminação da exploração do homem pelo homem” (FREITAS, 2003, p. 38).   

Nas diversos encontros nas escolas, os professores costumam tecer comentários sobre a situação de aprendizagem dos estudantes e seu modo de agir. Além disso, socializam fatos ocorridos em suas famílias. Tudo isso forma um conjunto de informações que contribui para que a escola forme sua imagem sobre cada um deles que, uma vez constituída, pode dificultar o processo de aprendizagem e a convivência no ambiente escolar. A prática da avaliação formativa impede que isso aconteça porque seu objetivo é impulsionar as aprendizagens de todos os estudantes, o que compreende a incorporação dos saberes curriculares e o desenvolvimento de atitudes socioemocionais condizentes com o trabalho pedagógico.     

Embora a avaliação informal esteja tão presente, podendo impactar positiva ou negativamente o processo de aprendizagem dos estudantes, o tema mais discutido durante atividades de formação de professores tem sido a avaliação formal. Praticada inadvertidamente, a informal pode causar danos à continuidade de estudos e à formação dos estudantes.

Conversamos até agora sobre a avaliação informal praticada por professores. O que motivou a escrita deste texto foi um fato por mim presenciado em uma escola inclusiva, no final do ano letivo de 2022. Caminhando pelo pátio da escola durante o recreio, parei à porta de uma sala de aula para conversar com duas estudantes quando, de repente, uma menina portadora de autismo pulou à minha frente e mexeu em meu cabelo (que é vermelho). Ela não fala. Quando estive em sua sala de aula, inicialmente me rejeitou mas, em seguida, se interessou pelo meu cabelo e se aproximou. Dirigi-me às duas meninas com quem conversava dizendo que aquela colega parecia gostar de mim. Imediatamente uma delas me disse: leva ela pra você e entrou na sala, sem que eu pudesse responder. Depreendi que estava fazendo uma crítica à colega que, talvez, a importunasse durante  o recreio, porque tem o hábito de ficar correndo.   

A avaliação informal entre colegas é inevitável e muitas vezes descortês. Nem sempre é  presenciada por professores.  Por meio da convivência diária os estudantes se conhecem e desenvolvem relações de amizade ou de atritos. Faz parte do trabalho pedagógico a construção de ambiente saudável na sala de aula e em toda a escola, para que se evitem animosidades, competição, classificação, rotulação e toda sorte de comportamento agressivo e antidemocrático. Com tais características a avaliação informal desencoraja o processo de aprendizagem e cria situações de afastamento da escola. Cabe aos professores permanecerem atentos a essas manifestações para impedirem que se alastrem e contaminem as atividades da sala de aula. É o que se espera da avaliação para as aprendizagens e como aprendizagem. Cabe aos professores darem o exemplo.  Os estudantes neles se inspiram.  São perspicazes e costumam repetir ações dos seus mestres.

O processo avaliativo é um componente estratégico do trabalho pedagógico pautado pela ética. O desejável é que a avaliação informal se ocupe das atividades de aprendizagem e não atinja a pessoa do estudante. Acompanhando e observando as atitudes dos professores os estudantes nelas se inspiram para se relacionarem com os colegas. Olhares de desaprovação, reprimenda e impaciência, assim como rótulos, não se alinham à avaliação formativa, comprometida comas aprendizagens de todos.    

Como conclusão, assinalamos que a sistematização do projeto político-pedagógico da escola, no qual a avaliação ocupa lugar central, parte da explicitação da função social da escola: qual o seu papel na vida das pessoas? Por que e para que as crianças e os jovens do século XXI vão à escola? Por que e para que avaliamos na escola?  (FERNANDES, 2014, p. 113).  “Para que avaliamos os alunos que têm direito constitucional de frequentar o Ensino Fundamental e a Educação Básica? Para que aprendam ou para ensiná-los que se vai à escola para passar de ano?” (FERNANDES, 2014, p. 113).  A avaliação informal acolhedora, respeitosa, que integre os estudantes e lhes transmita confiança e apoio é a que fortalece a função social da escola de proporcionar aprendizagens a todos os estudantes.  

Referência

FERNANDES, Cláudia. Por que avaliar as aprendizagens é tão importante? In FERNANDES, Cláudia de O. (org.). Avaliação das aprendizagens: sua relação com o papel social da escola. SP: Cortez, 2014.  

FREITAS, Luiz Carlos et al. Ciclos, seriação e avaliação: confronto de lógicas.  SP: Moderna, 2003.

FREITAS, Luiz Carlos et al. Avaliação educacional: caminhando pela contramão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.

 

Escolas adotam inteligência artificial para ajudar aluno a escrever redação

JC Notícia – 14/02/2023

Plataformas que corrigem textos instantaneamente e propõem formas de aprimorá-los devem ser introduzidas na rede pública de SP neste semestre; educadores sugerem cautela

“A inteligência artificial tornou-se uma ferramenta cada vez mais importante no campo da educação e uma das maneiras mais emocionantes de usá-la é ajudar os estudantes a melhorar suas habilidades de escrita.”

Foi assim que a nova vedete da inteligência artificial, a plataforma ChatGPT, iniciou um texto de seis parágrafos quando a Folha lhe enviou a seguinte solicitação: “Escreva um artigo sobre o uso da inteligência artificial para estudantes aprenderem a escrever redação”.

O artigo ficou pronto em 50,5 segundos. Ainda no primeiro parágrafo, o robô prosseguiu afirmando que as ferramentas “podem fornecer aos estudantes feedback instantâneo sobre seus ensaios, ajudando-os a identificar erros e a melhorar sua escrita com o tempo”.

Veja o texto na íntegra: Folha de S. Paulo

O Grupo Folha não autoriza a reprodução do seu conteúdo na íntegra. No entanto, é possível fazer um cadastro rápido que dá direito a um determinado número de acessos.

 

Por que tratar da avaliação institucional no início do ano letivo?

Benigna Maria de Freitas Villas Boas

Fevereiro de 2023

A escola de educação básica convive com três níveis de avaliação: a desenvolvida em sala de aula, por professores e estudantes; a autoavaliação pela escola, mais conhecida como avaliação institucional; e a avaliação em larga escala, realizada em nível nacional, pelo MEC, e pelos sistemas de ensino estaduais e municipais. Estes níveis se articulam e se fortalecem.

Como estamos iniciando o ano letivo de 2023 e a avaliação é a mola propulsora do trabalho pedagógico escolar, não é demais reavivarmos suas potencialidades.  Iremos nos debruçar sobre a avaliação institucional, que carece de discussão aprofundada sobre a sua concepção, práticas e articulação com os outros dois níveis.

A avaliação institucional mantém inseparável vínculo com o projeto político pedagógico da escola (DALBEN; SORDI, 2009). Constitui um processo desenvolvido ao longo doano letivo, quando se confrontam e se analisam as informações sobre a situação de aprendizagem dos estudantes e as advindas da avaliação em larga escala, como é o caso do SAEB, para que se identifiquem as necessidades de reorganização das atividades em cada turma e em toda a escola. O seu alvo são as aprendizagens de todos os estudantes. Isso se faz pelo acompanhamento das ações realizadas em todos os espaços de aprendizagem (salas de aula e outros), nos encontros do conselho de classe, nas coordenações pedagógicas, nos encontros com os pais, com os profissionais que atuam na escola, em festas comemorativas etc. Sendo assim, não é episódica, isto é, não tem dia nem hora para acontecer: é praticada continuamente, enquanto há tempo de serem oferecidas intervenções pedagógicas.

O projeto político-pedagógico não é um documento burocrático guardado no arquivo escolar. É considerado o “referencial para toda e qualquer ação no interior da escola, seja ação coletiva ou individual” (Dalben e Sordi 2009, p. 155). As atividades nele previstas e as desenvolvidas e a tomada de decisão sobre as necessidades de mudança de rumo constituem objeto de análise pela avaliação institucional. Enquanto o trabalho se realiza, esta avaliação pela escola está em curso. O seu registro se faz ao longo do ano. Ao seu final, são sistematizadas as informações recolhidas que, organizadas, farão parte  do documento sistematizador de todo o processo. Assim, a avaliação institucional é o processo de análise do trabalho escolar, registrado em um documento próprio.

Por meio da autoavaliação constante, isto é, da avaliação institucional, a escola olha para si com o intuito de reflexão e redimensionamento de suas atividades, sempre que necessário, para que o processo de aprendizagem dos estudantes e a atuação e a formação continuada dos professores prossigam sem percalços. Está sempre em busca de respostas a indagações como estas: o que está favorecendo e o que está dificultando a construção de aprendizagens pelos estudantes, em termos pedagógicos e administrativos? Quais as necessidades de reorganização do trabalho pedagógico, em sala de aula e em toda a escola? Quais providências devem ser tomadas para o atendimento às necessidades encontradas? Por isso, é um processo desenvolvido continua e participativamente. Toda a comunidade escolar nele se engaja. Não nos esqueçamos de que os pais/responsáveis  são colaboradores permanentes.  

Para que o processo de avaliação institucional cumpra o que dele se espera, é indicado o letramento em avaliação de toda a equipe escolar, no próprio ambiente de trabalho. Por que toda a equipe? Pelo fato de os seus componentes se envolverem no processo avaliativo e de modo particular na avaliação institucional. São momentos de incorporação de saberes relacionados à avaliação e de análise e de renovação de suas práticas.

O documento sistematizador da avaliação institucional não se presta a fazer parte do arquivo da escola. Fica acessível para consulta. Tem um papel a cumprir: orientar o início das atividades do ano seguinte, inclusive a organização do projeto político-pedagógico. Esta é a avaliação em processo.

Com esta configuração, a avaliação institucional se inscreve nos preceitos da função formativa da avaliação, por estar a serviço das aprendizagens. Consequentemente, duas práticas são abandonadas: a de ser “realizada” ao final do ano e a de cumprir exigências burocráticas do sistema de ensino. Em lugar de todas as escolas receberem roteiro padronizado para a sua organização, por que não deixar que cada uma crie a sua sistemática, segundo suas especificidades? Por meio desta dinâmica, o processo de letramento em avaliação está em curso.   

Referência

DALBEN, Adilson; SORDI, Mara R. L. Avaliação institucional: qual o seu “poder”? In SORDI, Mara R.L; SOUZA, Eliana da S. A avaliação como instância mediadora da qualidade da escola pública. Campinas: SP, Millenium, 2099.

 

CENSO ESCOLAR: APROVAÇÃO, REPROVAÇÃO, APRENDIZAGEM

Enílvia Rocha Morato Soares

          Para além do aumento de 1,5% no número de matrículas na maioria das etapas de ensino (mais incisivamente na rede privada), retornando aos patamares observados até antes da pandemia de covid-19, o Censo Escolar de 2022 revelou que as taxas de aprovação dos estudantes também começam a voltar aos índices do período pré-pandêmico. As taxas de 2021 (já que o censo foi coletado em maio de 2022) caíram em todas as etapas em relação a 2020: de 98,5% para 97,6% nos anos iniciais do Ensino Fundamental; de 97,8% para 95,7% nos anos finais; e de 95% para 90,8% no Ensino Médio.

            Isso porque durante o fechamento das escolas, por orientação do Conselho Nacional de Educação (CNE), ao final de 2020 os estudantes foram promovidos automaticamente, adiando a conclusão do ano letivo escolar. O objetivo de tal medida foi não punir crianças e adolescentes, uma vez que muitos deles vivenciavam processos de luto e ou de falta de acesso a direitos. Destacam-se, nesse cenário, as difíceis condições de vida e a falta de acesso adequado à internet para uma enorme parcela dos estudantes (Instituto de Pesquisa Aplicada [Ipea], 2020)[1], o que dificultou o acesso às atividades pedagógicas e causou a redução inevitável da qualidade do ensino decorrente, entre outras coisas, da falta de interação com o professor, colegas, materiais e espaços adequados para o estudo. Medida considerada, portanto, justa e necessária.

No entanto, o diagnóstico de volta às taxas de aprovação anteriores à pandemia, ou seja, a redução do número de estudantes aprovados e o consequente aumento de reprovados indica uma normalidade da reprovação.  É como se, em tempos regulares, reprovar fosse uma prática natural, implícita ao trabalho pedagógico. A lógica seriada que pautou a organização da “escola ocidental, moderna e, especificamente, a escola brasileira” (FERNANDES, 2014, p. 116) pode estar na base da “cultura da repetência” (Idem), obstaculizando caminhos rumo à construção de uma escola de e para todos.

Discussões que tomam como foco a aprovação e a reprovação costumam secundarizar o que de fato cabe à escola: viabilizar acesso às aprendizagens necessárias à formação integral de todos os estudantes. Reprovação não significa incapacidade para seguir avançando nos estudos, assim como aprovação não denota que os estudantes aprenderam e estão prontos para prosseguirem em seu processo de aprendizagem. Reprovação não constitui punição aos que não conseguiram aprender em um tempo predeterminado tudo o que havia sido previsto, assim como aprovação não é um meio de compensar os estudantes por privações de diferentes naturezas.  

Nem aprovar, nem reprovar. Nosso compromisso é com as aprendizagens.  As taxas de aprovação e reprovação, ainda uma realidade em muitas de nossas escolas, podem, no máximo, juntas às demais informações construídas junto aos estudantes e demais profissionais da escola, referenciar reflexões e a tomada de decisões sobre os rumos do trabalho pedagógico desenvolvido em sala de aula e em toda a escola.

A volta ao ensino presencial oportunizou o convívio diário com os estudantes, tão importante para o acompanhamento de seus avanços, para que tenham atendidas suas necessidades e se providenciem os meios para a continuidade das suas aprendizagens, cada um à sua maneira e ao seu tempo. É a avaliação formativa em ação, possibilitando o atendimento imediato às demandas de cada estudante e seu contínuo progresso. É a essa centralidade da avaliação que nos referimos quando insistentemente, destacamos sua importância no trabalho pedagógico.

Referências

Brasil. (2020). Nota Técnica nº 88 Acesso Domiciliar à Internet e Ensino Remoto Durante a Pandemia. Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/10228/1/NT_88_Disoc_AcesDomInternEnsinoRemoPandemia.pdf Acesso em: 09 fev 2023.

FERNANDES, Claudia de Oliveira. Por que avaliar as aprendizagens é tão importante? In.: FERNANDES, Claudia de Oliveira (Org.). Avaliação as Aprendizagens: sua relação com o papel social da escola. São Paulo: Cortez, 2014.


[1] A Nota Técnica nº 88 Acesso Domiciliar à Internet e Ensino Remoto Durante a Pandemia (Ipea, 2020) atesta que, no Brasil, cerca de 6 milhões de estudantes, desde a pré-escola até a pós-graduação, não têm acesso à internet banda larga ou 3G/4G em casa. Desse total, 5,8 milhões são alunos de instituições públicas de ensino.

 

Enem já vai mudar em 2024, diz novo presidente do Inep

JC Notícia – 10/02/2023

Reforma do ensino médio deixou currículo mais flexível, com opções de itinerários formativos para o aluno, o que exige mudanças na avaliação

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) deste ano deve ser o último no atual formato, em que todos os estudantes fazem uma mesma avaliação. Nos próximos meses, segundo o novo presidente do Instituto Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais (Inep), Manuel Palácios, o órgão vai trabalhar para ter uma prova que avalie não só o conteúdo comum, mas também as áreas específicas que agora fazem parte do ensino médio após a reforma dessa etapa de ensino. “No início de 2024, as escolas já precisam ter acesso às referências curriculares dessa nova parte”, disse ele, em entrevista ao Estadão, em seu gabinete, em Brasília.

As notas do Enem 2022 foram divulgadas nesta quinta-feira, 9, e podem ser usadas para mais de 200 mil vagas em universidades públicas e também em vestibulares de instituições particulares. Cerca de 2 milhões de estudantes fizeram o exame, número muito abaixo do que era registrado há alguns anos, quando os inscritos chegaram a 8 milhões. O ministro da Educação, Camilo Santana (PT), tem dito que quer recuperar o prestígio do Enem e trazer mais jovens para a prova, que cresceu e se tornou um grande vestibular em 2009, no segundo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Desde então, a prova tem 180 questões, divididas em quatro áreas do conhecimento, e mais uma redação. Com a lei que mudou o currículo do ensino médio no País, escolas públicas e particulares oferecem desde 2022, além das 1,8 mil horas de disciplinas obrigatórias, os chamados itinerários formativos (conteúdos optativos, parte de uma carga horária flexível dessa etapa de ensino).

Veja o texto na íntegra: O Estado de S. Paulo

O Estado de S. Paulo não autoriza a reprodução do seu conteúdo na íntegra. No entanto, é possível fazer um cadastro rápido que dá direito a um determinado número de acessos.

 

Ahh!! Estes críticos intolerantes!

Publicado em 01/02/2023 por Luiz Carlos de Freitas, no blog do Freitas

O Ministro da Educação concedeu uma entrevista para a Veja. O resumo da entrevista, na visão de Veja, está na frase “Ministro afirma que, para o país virar a página do mau ensino, é preciso pacto nacional movido a metas, meritocracia e mais dinheiro, este um grande desafio”. Eis os ingredientes do sucesso do governo Lula na educação: metas, meritocracia e dinheiro.

Leia entrevista aqui.

Os que se detiveram a analisar a experiência cearense, que agora deverá ser difundida institucionalmente via MEC para todo o país, sabem da proximidade das Fundações e ONGs na educação naquele estado. O próprio Veveu do PT, ex-prefeito de conhecida cidade, Sobral, sempre apresentada como cartão de visita inclusive pelas Fundações, dirige uma ONG que faz assessoria educacional. Foi sua gestão municipal que impulsionou o modelo na cidade, tendo Izolda Cela como Secretária de Educação (a qual hoje é Secretaria Executiva do MEC e estudou com Manuel Palácios, também hoje no MEC como presidente do INEP). Já divulgamos (veja aqui) os vínculos de Veveu com a Fundação Lemann também.

A primeira constatação a ser feita da entrevista é que o Ministro desconhece o campo da educação. É somente um gestor que ouviu algumas teses gerencialistas, do tipo: bastam metas, meritocracia e dinheiro para resolver o problema da educação (que tal olhar para a experiência fracassada de meritocracia no Estado de São Paulo).

Claro, os reformadores empresariais jamais reconhecem que suas teses fracassam. Quando confrontaram G. Bush com o fracasso da “accountability” americana, ele respondeu: “faltou mais accountability”. Para o reformador empresarial, a “responsabilização” quando não funciona é porque foi mal feita. Como bem aponta Ravitch, a bonificação por desempenho, comum nas meritocracias, nunca funciona, mas é uma crença que nunca morre na educação.

Antevendo embates com os profissionais que entendem de educação, o ministro apressa-se em colocar antídotos, bem ao gosto do privatismo.

Primeiro, ante a colocação da Veja de que a Confederação Nacional de Trabalhadores da Educação se manifestou contra o secretariado do Ministro dizendo que ele é afinado com instituições privadas, responde que isso não faz “nenhum sentido”, pois todos, como ele, “defendem e trabalham pelo avanço da qualidade. “Este tipo de crítica e um equívoco”, diz.

Para o Ministro, penso, só se privatiza quando se vende um bem público. Mas, quando se introduz a lógica gerencial nas escolas via Fundações, não. E pela lógica de setores do PT, quando se concede ou terceiriza serviços públicos para a iniciativa privada, também não se está privatizando, pois não está havendo venda.

Provocado a reagir sobre um possível embate com pessoal “das fileiras mais radicais e militantes da educação” responde:

“Precisamos desarmar as pessoas nestes tempos de polarização e parar para conversar. Diferenças existem e são salutares. O inadmissível é a falta de diálogo e a intolerância com quem não pensa rigorosamente igual a você.”

Mas, participação vai muito além de receber protocolarmente uma entidade para trocar pontos de vista respeitosamente. Significa criar mecanismos que permitam uma interação criativa. Mas, se o Ministro já definiu unilateralmente a política, pouco se pode fazer nesta direção.

O escudo para esta “participação protocolar” é a frase de sua entrevista: “as diferenças são salutares” mas sem “intolerância”.

Ocorre que a crítica está vindo de entidades acadêmicas, sindicais e científicas do campo da educação com longa experiência na análise da questão educacional e não de indivíduos isolados. Seria de se esperar que tais entidades fossem ouvidas na confecção da política educacional e não as teses de fundações ou entidades privadas. Aqui não pode haver simetria.

Preve-se, portanto, que, como o Ministro já tem uma  política educacional importada do Ceará, qualquer conversa é meramente protocolar e feita em nome de veicular as diferenças. Enquanto as Fundações têm livre acesso à formulação da política, via Ceará, as entidades educacionais podem opinar desde que de forma tolerante.

A entrevista também prepara um segundo antídoto à crítica: o debate, diz, não pode estar pautado pelo “filtro ideológico”. E aqui é que seu desconhecimento da área educacional se mostra pleno. A educação é pautada por finalidades educativas que inevitavelmente apontam para formas de ver e se comportar no mundo. É impossível não ter ideologia – a não ser como farsa e ocultação. Para evitar a ideologia, o Ministro recomenta seguir o que ouve das Fundações: “consultar as pesquisas e ouvir o que diz a ciência”, como se esta fosse neutra…

Enfim, é inócuo que se tente alterar o caminho escolhido pelo MEC sob a gestão Camilo. Ceará virou um modelo a ser seguido. Em suas palavras: “Vou pregar em prol dele em todos os estados, mostrando evidências científicas do que funcionou, dando estímulos e tentando dissolver o clima de polarização, que só atrapalha.” Ou seja, a crítica é admitida apenas para aprimorar o modelo Ceará. Mais que isso é radicalismo ideológico.

A experiência americana com esta política educacional é clara em suas consequências, como afirma Daniel Koretz em seu livro: The Testing Charade: Pretending to Make Schools Better.  Recentemente ele escreveu um artigo sobre o fracasso dos estudantes americanos tanto no PISA como em exames internos nos Estados Unidos. Para ele:

“O debate de rotina está em andamento sobre o quão ruim é essa notícia, mas esses argumentos geralmente perdem uma lição essencial: o movimento de reforma escolar dos EUA claramente falhou. É hora de enfrentar esse fracasso e pensar em novas abordagens para melhorar a educação.

Houve inúmeras reformas nas últimas duas décadas, mas no centro delas estão os esforços para pressionar os educadores a aumentar as notas nos testes. A ideia é enganosamente simples. Os testes medem coisas importantes que queremos que os alunos aprendam. Responsabilize os educadores por aumentar a pontuação e eles ensinarão mais as crianças. E, concentrando a responsabilização em grupos com baixa pontuação – na maioria das vezes, estabelecendo metas uniformes por meio de leis estaduais ou federais, como o No Child Left Behind ou Every Student Succeeds Act -, fecharemos as lacunas de desempenho. Infelizmente, esse conceito acabou sendo mais simplista do que simples, e não funcionou.”

Leia aqui.

E como diz H. L. Mencken: “Para todo problema complexo existe uma solução clara, simples e errada.”

E antes que os mais realistas do que o próprio rei queiram evitar esta crítica que faço ao Ministro argumentando que é muito cedo para criticá-lo, repito aqui as palavras de Lula ditas a sindicalistas em recente pronunciamento: “se ninguém reclama, então, conclui-se que está tudo bem”.