Como escrita à mão beneficia o cérebro e ganha nova chance em escolas

BBC News Brasil

29/01/2024

Especialista diz que ‘escrever letras em cursivo, especialmente em comparação com digitar, ativa caminhos neurais específicos que facilitam e otimizam o aprendizado’

A partir de 2024, crianças do primeiro ao sexto ano de escolas públicas da Califórnia (EUA) estão novamente tendo de aprender a escrever em letra cursiva.

Essa escrita à mão havia saído do currículo californiano em 2010, mas agora está de volta — movimento semelhante ao que ocorre em mais de 20 Estados americanos, em diferentes graus.

A escrita cursiva — em que se escreve em uma letra parecida à itálica, sem necessariamente tirar o lápis do caderno — chegou a ser vista como uma técnica moribunda nos EUA.

Agora, a decisão na Califórnia reacende debates educacionais e científicos a respeito do valor da escrita à mão, bem como dos benefícios ao cérebro e das implicações globais se essa técnica acabar caindo no esquecimento.

A neurocientista Claudia Aguirre, que mora na Califórnia, diz que “mais e mais pesquisas sustentam a ideia de que escrever letras em cursivo, especialmente em comparação com digitar, ativa caminhos neurais específicos que facilitam e otimizam o aprendizado e o desenvolvimento da linguagem”.

No Brasil, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) prevê o ensino da habilidade de se escrever em letra cursiva nos primeiros anos do ensino fundamental.

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Karin James, professora de Ciências Cerebrais e Psicológicas na Universidade de Indiana (EUA), aplica suas pesquisas em crianças de 4 a 6 anos.

Ela identificou que aprender as letras por meio da escrita à mão ativa redes do cérebro que não são ativadas pela digitação num teclado. Isso inclui áreas cerebrais que têm papel crucial no desenvolvimento da leitura.

Outra pesquisa, de autoria de Virginia Berninger (Universidade de Washington), também mostrou que a escrita cursiva, os materiais impressos e a digitação usam funções cerebrais relacionadas, porém diferentes.

Além disso, no caso da digitação em teclado, os movimentos do dedo são os mesmos para qualquer tecla de letra. Como consequência, se apenas aprenderem a digitar, as crianças perderão a chance de desenvolver habilidades obtidas ao compreenderem e dominarem a capacidade de escrever.

Um pequeno estudo italiano aponta que o ensino da cursiva a alunos de primeiro ano podem melhorar as habilidades de leitura.

A despeito disso, o ensino da letra cursiva para crianças pequenas vinha se tornando mais raro. Em vários países, essa técnica não é mais obrigatória.

Nos EUA, embora o ensino da cursiva esteja voltando à luz, ele não é padronizado — o que traz desafios aos professores.

“Mais de 20 Estados acrescentaram a suas diretrizes educacionais a exigência da escrita cursiva entre o 3° e o 5° anos”, explica Kathleen S. Wright, fundadora e diretora-executiva do Colaborativo de Escrita à Mão, organização que ensina boas práticas nessa área. “Mas essa exigência não é imposta nem recebe financiamento, então o ensino da escrita à mão não é endereçado de forma consistente.”

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“Temos visto cada vez mais pais reclamando que seus filhos estão tendo dificuldades na escola, que não foram ensinados a escrever porque usam principalmente computadores e outros aparelhos”, diz pesquisadora

Dessa forma, professores californianos terão agora de descobrir como integrar a cursiva a suas aulas.

Mesmo assim, a iniciativa do Estado é vista como benéfica, num momento pós-pandemia em que se buscam formas de ensinar habilidades que reduzam a dependência das telas entre crianças.

“Temos visto cada vez mais pais reclamando que seus filhos estão tendo dificuldades na escola, que não foram ensinados a escrever porque usam principalmente computadores e outros aparelhos”, diz Kelsey Voltz-Poremba, professora-assistente de terapia ocupacional da Universidade de Pittsburgh (EUA).

A escrita cursiva ainda é amplamente ensinada na Europa Ocidental, em particular em países como Reino Unido, Espanha, Itália, Portugal e França.

Já a Finlândia pôs fim à exigência da escrita cursiva de suas escolas em 2016.

O Canadá tentou descartar a escrita cursiva, mas voltou a ensiná-la em 2023. O Ministério de Educação da província de Ontário restabeleceu a exigência da escrita cursiva e agora está virando uma espécie de laboratório para outras regiões que tentam entender quais as melhores práticas para esse ensino, quanto tempo devem durar as aulas e com qual frequência essa técnica deve ser ensinada.

Em meio a tantas diferenças globais, as pesquisas ressaltam que não há lado negativo em aprender letra cursiva. E embora a ligação entre escrever à mão e melhorar a leitura não sejam necessariamente causais, alguns educadores temem que o abandono da letra cursiva pode piorar o desempenho de alunos em sua capacidade de ler textos.

Além disso, o mero ato de escrever ajuda a memória e o aprendizado de palavras.

“É importante achar um equilíbrio para garantir que os alunos tenham habilidades que sejam obtidas sem o uso da tecnologia”, opina a especialista Voltz-Poremba.

 

Primeiro dia de aula: iniciando o ciclo da avaliação formativa

Benigna Maria de Freitas Villas Boas

Publicado em

benignavillasboas.com.br

gepa-avaliacaoeducacional.com.br

A avaliação costuma ser o componente do trabalho pedagógico que mais amedronta estudantes de todos os níveis: ensino fundamental, médio, universitário, mestrado e doutorado, em todos os tempos. Antes de prosseguirmos, relembremos como se constituiu o processo avaliativo nas escolas brasileiras.

Luckesi (2021) afirma que, “no que se refere à educação escolar, historicamente somos herdeiros diretos do século XVI, momento em que se estruturou, se organizou e se colocou em funcionamento o modelo de escola que conhecemos hoje” (p. 41).  

Dois fatos históricos influenciaram e ainda influenciam o trabalho pedagógico e, de modo especial, o processo avaliativo em nossas escolas, de todos os níveis: as prescrições da Ratio Studiorum e da obra Leis para a boa ordenação da escola, de autoria de Comênio.

Em 1599 foi publicada a Ratio Studiorum, documento elaborado pela Companhia de Jesus, ordem religiosa dos padres jesuítas, contendo o ordenamento pedagógico e administrativo dos seus estabelecimentos de ensino.

Segundo a Ratio Studiorum, os professores eram os responsáveis diretos pelo ensino e pela formação religiosa e moral dos estudantes. Para auxiliá-los em sua atividade docente e disciplinar, “eram nomeados estudantes, considerados os ‘melhores’, entre seus pares, recebendo a denominação de Bedéis” (Luckesi, p. 51). Assim teve início a classificação dos estudantes, ainda presente em muitas de nossas escolas.

Ao lado disso, os jesuítas instituíram a “pauta do professor”, caderneta em que se registravam os “resultados individuais obtidos por cada estudante nas diversas atividades de ensino durante o ano letivo” (p. 75). Luckesi comenta que esta pauta, que registrava os atos avaliativos e o uso dos seus resultados,  cumpria um fim diagnóstico dos resultados da investigação avaliativa “para, de um lado, garantir a aprendizagem satisfatória dos estudantes e, de outro, subsidiar os procedimentos de sua promoção de uma classe a outra” (p. 75).

Em 1657 Comênio publicou a obra Leis para a boa ordenação da escola, em que propõe os exames escolares como recursos de ensino-aprendizagem, da seguinte forma:

Exames realizados a cada hora de aula, sob a responsabilidade do professor, para manterem os estudantes sempre atentos.

Exames diários, de responsabilidade do decurião, que era o estudante mais avançado e que deveria cuidar dos seus pares.

Exames semanais, de responsabilidade de todos os estudantes, sendo realizados no último dia útil da semana, sob a forma de competição entre todos; o estudante vencedor deveria ocupar o lugar de ‘vencedor’ e o perdedor deveria ser rebaixado;

Exames mensais, sob o comando do Reitor da escola, acompanhado do Pastor local e de um membro do Conselho Administrativo da escola, para, mediante exame rigoroso, inspecionar, por meio da verificação da aprendizagem dos estudantes, se os programas de ensino estavam sendo realizados a contento;

Exames trimestrais, realizados por dois membros do Conselho Administrativo da escola e pelo Reitor, para identificar os estudantes com melhor desempenho em suas aprendizagens e os mais brilhantes. O professor da turma estaria ausente.

Exames anuais, realizados ao final do ano letivo, sob a responsabilidade do Colegiado Pleno do Conselho Administrativo, para verificar se o Programa de Ensino Anual fora cumprido.  (LUCKESI, 2021, p. 133-134).

Os professores se incumbiam apenas dos Exames realizados a cada hora de aula, tarefa que poderia ser considerada de menor importância do que as demais. Esses exames pareciam servir apenas para manter os estudantes atentos e não, primordialmente, para oferecer informações sobre o que e como estavam aprendendo. Manter os estudantes atentos poderia significar ficarem quietos.

Observa-se a presença marcante da competição, sob a forma de classificação dos estudantes, para destacar “o mais avançado”, o “vencedor” e “os mais brilhantes”. Ainda hoje encontramos tais iniciativas em muitas escolas brasileiras.  

A avaliação das aprendizagens/para as aprendizagens praticada atualmente nas escolas brasileiras não corresponde à proposta por Comênio, autor do Livro Didática Magna, usado em cursos de formação de professores por algum tempo. Contudo, estudantes eleitos como “destaques”, premiação daqueles mais “brilhantes” e outras formas de competição têm sido adotadas, inviabilizando a prática da avaliação formativa. Além disso, ainda enfrentamos dificuldades, tais como: provas como o único procedimento de avaliação e somente para atribuição de notas; semana de provas, para facilitar o trabalho dos professores; ausência de participação dos estudantes na organização do processo avaliativo; ausência de oferecimento de feedback aos estudantes e da autoavaliação, além da falta de cuidado quanto ao uso da avaliação informal em sala de aula e em toda a escola.

Reorganizar o trabalho pedagógico do ano que se inicia ou, em outras palavras, reconstruir a proposta pedagógica da escola, ou o seu projeto político-pedagógico, requer eleger a avaliação como ponto de partida. Várias podem ser as discussões sobre este tema. Delimito-o ao que o título deste texto sugere: primeiro dia de aula – iniciando o ciclo da avaliação formativa.

Em qualquer nível de ensino, os primeiros encontros são impregnados de avaliação, propositalmente ou não. Refiro-me ao processo de avaliação, em sentido amplo, por meio do qual professor/a e estudantes interagem, possibilitando que ambos conheçam as aprendizagens conquistadas, em busca das que estão por vir.

Na escola todos avaliam e todos são avaliados. Vale o velho ditado: as primeiras impressões são as que permanecem. Por isso, é importante que, no primeiro encontro do ano, professores e estudantes se conheçam, para criação de ambiente confortável, acolhedor e propício às aprendizagens. Por meio de conversa tranquila, a avaliação diagnóstica tem início. Para isso, informalmente, o professor conduz a conversa, utilizando perguntas previamente organizadas. Essa avaliação pode ser no grande ou em pequenos grupos e devidamente registrada.  

Costumeiramente, os estudantes tentam encaminhar a conversa para provas, notas, trabalhos e prazos de entrega. Usar todo o tempo da primeira aula do ano para estes aspectos mais burocráticos desvia o foco da avaliação formativa. Será mais adequada uma explanação sobre o processo avaliativo do semestre, com ênfase nas aprendizagens e no progresso de todos. Habilidosamente o/a professor/a seguirá este rumo, dizendo que essas questões serão discutidas mais adiante e que eles participarão apresentando sugestões. O objetivo do primeiro contato estudantes/professor/a é a organização conjunta do trabalho pedagógico, incluído o processo de avaliação. Poderá ser desenvolvida sistemática de trabalho condizente com cada turma de estudantes.  

Alguém poderá argumentar: isso é perda de tempo. É melhor encurtar a conversa e começar a trabalhar logo. Este é o início das atividades, com a presença da avaliação diagnóstica, adaptada a cada situação/curso/disciplina. Importante salientar que esta função avaliativa, quando assim desenvolvida, é aliada da formativa, isto é, a ela se articula.  

Como meio de os professores impulsionarem as aprendizagens de seus estudantes desde os primeiros dias de aula, quando se estabelece a confiança entre ambas as partes, proponho que iniciem o desenvolvimento do que Brookhart (2023) denomina de ciclo da avaliação formativa, constituído por três questões a serem respondidas por cada estudante: onde estou indo? Onde estou agora? O que fazer em seguida? Segundo a autora, cada uma delas assim se estrutura:  

A questão “onde estou indo?” se desdobra nas seguintes: “o que estou tentando aprender? Quais meios garantirão minhas aprendizagens?”

A questão: “onde estou agora?” se desdobra nas seguintes: “como meu trabalho se encontra em relação aos meios que me permitirão obter sucesso?” “Qual compreensão posso construir?”

A questão: “O que fazer em seguida?” se desdobra nas seguintes: “quais os próximos passos para o alcance das aprendizagens? Como preencher a lacuna entre o não aprendido e o aprendido?” (p. 6)

A autora faz um alerta importante: “O ciclo da avaliação formativa funciona melhor no contexto da sala de aula em que os estudantes se sentem seguros para expressar suas ideias e em que seus enganos são vistos como oportunidades de aprendizagem” (p. 7). Este ambiente seguro é construído desde o primeiro dia de aula. Como nossos estudantes e suas famílias estão acostumados ao processo avaliativo em que notas, provas e classificação têm assumido lugar central, a adoção do ciclo da avaliação formativa, proposto por Brookhart (2023), poderá, desde o primeiro dia de aula, ser de grande valia, desde que adaptado a cada contexto escolar. Cabe ressaltar que a autoavaliação pelos estudantes cumprirá papel importante nesse processo. O/a professo/a cuidadoso/a, por ser pesquisador/a da sua prática, saberá encaminhar esse processo.  

  A dinâmica deste ciclo se repete ao longo do ano letivo, atrelando os objetivos de aprendizagem à avaliação.  

As contribuições da autora vêm ao encontro da proposta deste texto, no sentido de o processo avaliativo assumir protagonismo desde o primeiro dia de aula, alavancando discussões, reflexões e proposições para o desenvolvimento do trabalho pedagógico, envolvendo os estudantes na sua constituição.       

Referências

BROOKHART, Susan. Classroom assessment: essentials. ASCD, Arlington, Virginia, USA, 2023.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem: passado, presente e futuro. SP: Cortez, 2021.

 

Gestão Tarcísio de Freitas vai avaliar diretores de escolas, e nota ruim pode levar à perda de cargo

JC Notícias – 23/01/2024

Desempenho será medido com base na frequência de alunos, participação em avaliações e uso de plataformas digitais; objetivo é aprimorar supervisão da rede, diz governo paulista

O governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) vai avaliar o desempenho dos diretores das escolas estaduais de São Paulo. Profissionais que não alcançarem um patamar considerado satisfatório poderão ser penalizados com a perda do cargo e até mesmo remoção para outra unidade.

Uma resolução com as regras sobre a avaliação foi publicada no Diário Oficial nesta segunda-feira (22) e passará a valer já neste ano letivo. Segundo o texto, a política atende aos “princípios da meritocracia e da busca contínua pela excelência no campo educacional”.

A avaliação dos diretores será feita com base em quatro indicadores: frequência dos estudantes da unidade, participação nas avaliações bimestrais, uso de plataformas digitais e índice de vulnerabilidade da escola.

Veja o texto na íntegra: Folha de S. Paulo

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