Helder Gomes Rodrigues – Mestre em Linguística Aplicada, integrante do GEPA
Recentemente, a Secretaria de Estado de Educação do DF, assim como outras capitais do país, anunciou o retorno 100% presencial dos estudantes às atividades escolares. Desde o início do segundo semestre de 2021, as aulas presenciais no DF retornaram de forma escalonada, respeitando as diferentes etapas da educação básica. Como havia no período a obrigatoriedade de distanciamento entre os estudantes, as turmas tiveram que ser divididas. Dessa forma, os professores atendiam de maneira híbrida um grupo presencial e outro de forma remota. Esse revezamento dos estudantes vigorou até a decisão da SEDF de descontinuidade desse tipo de atendimento, passando todos os alunos a serem atendidos de forma presencial, exceto os casos de comorbidades.
Durante as lives e as apresentações da SEDF sobre o retorno presencial sem revezamento dos estudantes, uma afirmação que chama a atenção é a fala de que os estudantes podem entregar atividades em atraso para “ recuperar as aprendizagens”. Ora, como recuperar algo que não existiu? Na perspectiva de que a aprendizagem é uma construção, um processo em que a avaliação formativa se faz presente todo o tempo, não se pode falar de entregas de trabalhos e atividades ao final do bimestre ou ano letivo. Para que de fato a avaliação seja para as aprendizagens, é necessário que o professor acompanhe os estudantes durante a realização das atividades, com feedback constante e reorganização do planejamento, quando necessário, para atender as necessidades dos estudantes e não deixar ninguém para trás.
A ideia de “recuperação das aprendizagens” ao final do ano letivo soa como uma prática tradicional e somativa mascarada de avaliação formativa. De acordo com Villas Boas (2019,p.20), “todas as atividades realizadas são avaliadas na perspectiva formativa”. Para que essa avaliação seja viável, é necessário o envolvimento de alunos e professores durante o processo. Uma avaliação realizada apenas por meio de um instrumento e ao final do período letivo é limitada e não consegue abarcar a característica multifacetada da aprendizagem.
Enfatizamos a necessidade de adoção da avaliação formativa ou avaliação para as aprendizagens porque a própria SEDF afirma e reafirma em seus documentos ser esta a concepção de avaliação por ela adotada. Assim, cabe indagar sobre a coerência entre os documentos, os discursos e a prática da SEDF.
Nesse momento de retorno às aulas presenciais, a avaliação precisa superar a lógica de fim ou última etapa do processo. De acordo com Fernandes (2009), a avaliação formativa é centrada na melhoria das aprendizagens, devendo ser participativa e integrada aos processos de ensino e de aprendizagem. Nessa perspectiva, a avaliação formativa necessita desvincular-se de uma ação de mero cumprimento burocrático ou com objetivo de aprovação e reprovação. Aliás, essa dicotomia não deveria permear o olhar na avaliação nesse momento tão complexo e delicado de retorno às aulas em meio a uma pandemia. Precisamos mais que nunca de uma avaliação compromissada com a aprendizagem, essencialmente formativa.
Por fim, as secretarias de educação deveriam preocupar-se com o diagnóstico da realidade dos estudantes. Deveriam utilizar as informações da avaliação diagnóstica para discutir sobre o currículo, o planejamento e os objetivos de aprendizagem para então formular ações que perpassem esse período de um pouco mais de quarenta dias para terminar o ano letivo.
A pandemia não acabou. O futuro ainda é turvo e certamente trará consequências para a escola e para as aprendizagens dos estudantes que não poderão ser negligenciadas. Nesse sentido, podemos afirmar que a avaliação verdadeiramente formativa é atemporal. É também compromissada, ética e encorajadora e pode ser um caminho promissor rumo às aprendizagens.
Referências
FERNANDES, Domingos. Avaliar para aprender: fundamentos, práticas e políticas. São Paulo: UNESP, 2009.
VILLAS BOAS, Benigna M. de Freitas (org). Conversas sobre avaliação. Campinas: SP, Papirus,2019.