Avaliação: respeito, cuidado e zelo com o outro

Erisevelton Silva Lima – Pedagogo, Doutor em Educação pela Universidade de Brasília-UnB, Professor da SEEDF e formador para docência nas escolas judiciais e de magistratura brasileiras

            A maneira como tratamos as pessoas no trabalho revela, quase sempre, como lidamos com o outro no cotidiano, independentemente da profissão abraçada. A questão da avaliação torna os tons mais fortes, porque muitos avaliadores parecem desfrutar de uma situação ultraprivilegiada e repleta de vaidades. Como bem afirmam Freitas e outros (2009), a avaliação abre ou fecha portas, nesse sentido reiteramos a necessidade de mantê-las, pelo menos, entreabertas; a intenção é a de que evitemos danos maiores ou prejuízos indeléveis para aqueles que estão aprendendo.  À guisa da garantia do controle, muitos avaliadores dilaceram a ética e a compaixão em nome de algo presumível, porém pouco tangível, ou seja, o próprio conceito de qualidade; a isso Sordi e Santos (2021) denominam, acertadamente, de avaliocracia.

            Não podemos esquecer que somos todos sujeitos da aprendizagem enquanto avaliamos, a diferença é o sentimento que ficará com o outro em razão de como foi ou não respeitado. Cumpre lembrar que assim se estrutura o “profissionalismo” daqueles que tecem os fios da colcha artesanal da avaliação, infelizmente, sem que percebam as diversas exclusões praticadas. Não foi em vão que Hoffmann (2014) alertou-nos que ao avaliar nos denunciamos.

            Sabemos, sobejamente, que a avaliação no percurso difere da avaliação do percurso. Todavia, percorrer com o outro garantindo-lhe a escuta, ajustando o itinerário formativo e potencializando o diálogo entre o avaliador com o avaliado pode atenuar as dores e os dissabores que permeiam essa jornada. Avaliar é uma tarefa árdua e repleta de sentimentos, ora bons, ora ruins. Recorramos a Marshal Rosenberg (2006) para lembrarmos que a forma como nos comunicamos pode ser mais ou menos violenta e, com isso, intensificamos a saúde do diálogo entre o avaliador com o avaliado. Em decorrência dessas e outras, algumas questões precisam ser eleitas, quais sejam: como estabeleço um diálogo avaliador respeitoso, como realizo uma escuta ativa no momento da avaliação, como permito ao estudante manifestar suas dúvidas e angústias no processo educativo/avaliativo, como garanto a defesa e o argumento do sujeito que avalia enquanto é avaliado? Tais respostas podem nos ajudar nos momentos privilegiados da formação dos professores novos ou daqueles mais experientes. Talvez esteja aqui o objetivo deste pequeno texto reflexivo: que cada um preencha com suas próprias respostas.

            Cumpre lembrar que nossas experiências, vagas ou vastas, são detentoras de inúmeros prejuízos causadores das impaciências para ouvir, escutar e se conectar com o outro. Somos apressados, nossas preconcepções se arvoram e antes mesmo que o outro fale já completamos o pseudosentido da frase ou palavra que deduzimos. Eis um desafio hercúleo, aprender a escutar. É, pois, nesse sentido que sugerimos o uso dos diálogos que potencializem a autoavaliação como precursores dos estágios de acolhida, escuta e conexão com aqueles que agora aprendem. Tais diálogos, socráticos, deixam o outro falar, elaborar e refletir sem medo de punição, vale lembrar.

Aprendamos como avaliar, sobretudo, com humanismo. Para isso precisamos que os sujeitos avaliados possam, também, avaliar a avaliação a que foram submetidos. A bandeira ou tema da avaliação abala as relações institucionais e pessoais. Nossa história de avaliar para excluir e punir ainda deixa o campo educacional tenso e fértil para desconfianças e medos, e isso é muito ruim. Os diálogos que estimulam a autoavaliação podem corroer essas rígidas estratégias da cultura avaliativa, os sujeitos da avaliação não precisam ser vistos como perseguidores ou perseguidos, eles podem entender que a avaliação que desejamos é formativa e, portanto, interventiva, dialogada, consensual e ética. Como bem disse Villas Boas (2014), trata-se de avaliar para a aprendizagem. Quanto mais os sujeitos do processo educativo/avaliativo demonstrarem segurança e confiança uns nos outros, melhores serão os resultados. Não precisamos ameaçar ou amedrontar para ensinar, muito menos para aprender.

REFERÊNCIAS

FREITAS, Luís Carlos de e outros. Avaliação Educacional: caminhando pela contramão. Ed Vozes, RJ, 2009.

HOFFMMANN, Juçara. Avaliação Mediadora: uma prática em construção da pré-escola à universidade. 33. ed. Porto Alegre, RS: Mediação, 2014

ROSENBERG, Marshall B. Comunicação não-violenta: técnicas para aprimorar relacionamentos pessoais e profissionais. Ed. Ágora, RJ, 2006.

SORDI, Mara Regina Lemes de. SANTOS, Marcos Henrique Almeida dos. O lugar da avaliação das aprendizagens em uma perspectiva histórico-crítica. In: VEIGA, Ilma Passos A. FERNANDES, Rosana César Arruda, (Org) Por uma Didática da Educação Superior. Autores Associados- SP, 2021.

VILLAS BOAS, Benigna Maria de Freitas. Avaliação para a aprendizagem na formação de professores.  Cadernos de Educação, Brasília, n. 26, p. 57-77, jan./jun. 2014

 

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