EMPRESAS TROCAM RANKING DE NOTAS POR AVALIAÇÃO CONTÍNUA DE FUNCIONÁRIOS
Benigna Maria de Freitas Villas Boas
Reportagem da Folha de São Paulo de 03/04/2016 afirma que “as empresas têm substituído as avaliações esporádicas de desempenho dos funcionários, em geral uma ou duas vezes ao ano, por um processo de feedback mais contínuo”. Acrescenta: “a ideia é que a análise não seja só uma burocracia no trabalho e, sim, possa ser usada como ferramenta pelas companhias para alinhar e rever metas e ajudar no desenvolvimento profissional”. Especialistas no assunto consideram que o feedback ajuda a motivar e reter o funcionário.
A Microsoft, por exemplo, passou de duas avaliações ao ano para, no mínimo, quatro. Além disso, são feitas conversas informais constantes entre chefe e membros de sua equipe.
A reportagem enfatiza que o processo ganhou novo foco: “em vez de se basear em resultados obtidos e comparar os funcionários em um ranking de notas, passou a ser analisado o impacto do profissional no negócio”.
Um funcionário de uma empresa que adota essa sistemática declara que a conversa com seu gestor se tornou mais frequente e “fica mais fácil saber a direção que as coisas estão tomando, e como melhorar meu trabalho antes de receber a avaliação formal”.
Uma consultora de uma empresa afirma que “o sistema deixa mais claro o impacto do meu trabalho e fico a par das expectativas sobre mim”.
Em outra grande empresa, o gerente não dá mais nota nem faz comparação entre a equipe.
Interessante observar que a sistemática descrita se aproxima da avaliação formativa adotada em escolas de educação básica e superior. Há grandes diferenças, obviamente. No mundo empresarial o principal objetivo é o lucro, é o mero alcance de metas, enquanto nas escolas buscam-se as aprendizagens dos estudantes. As empresas investem em seus funcionários para que eles produzam e o façam sempre o mais rapidamente possível. As escolas buscam a formação de todos os estudantes, sem excluir ninguém. As empresas usam o feedback para motivar e reter o funcionário no qual elas estão investindo. As escolas o praticam para que as aprendizagens prossigam, sem percalços.
O fato de se abandonar a ideia de notas, de ranking e de comparação entre os funcionários também chama a atenção. Nas escolas essa prática corresponde à avaliação classificatória, que vem sendo combatida por ser excludente e não promover as aprendizagens. Cabe refletir: enquanto as empresas estão interessadas em deixar para trás notas, ranking e comparação entre trabalhadores, os testes padronizados ganham força e espaço no tempo escolar. O IDEB contribui para isso.
A inclusão de “conversas informais” no processo avaliativo das empresas pode ser um mecanismo a mais de controle do trabalhador. Enquanto nas escolas a avaliação informal articula-se à formal para que o professor amplie sua compreensão sobre o processo de aprendizagem do estudante a fim de auxiliá-lo, nas empresas pode ser apenas mais uma forma de monitoramento, reduzindo a autonomia do trabalhador. Vale pensar sobre os possíveis benefícios e malefícios dessa prática. A avaliação contínua é uma faca de dois gumes.
Gostaria muito de saber qual fundamentação teórica norteou a decisão das empresas de mudar o seu processo avaliativo. Nas escolas não tem sido fácil abandonar a avaliação classificatória e construir a formativa. Os professores, de modo geral, querem manter o processo avaliativo ao qual foram submetidos. É grande a resistência à avaliação comprometida com as aprendizagens de todos. Como esse processo tem sido conduzido nas empresas? Quais têm sido as reações de toda a equipe?
Embora alguns aspectos não estejam claros na reportagem, é interessante saber que empresas privadas estão desenvolvendo nova perspectiva avaliativa como ferramenta para alinhar, rever metas e ajudar seus funcionários no desenvolvimento profissional.
Vejo como avanços as empresas não considerarem os funcionários apenas pela nota obtida, sobretudo, se o processo avaliativo estiver humanizando as relações trabalhistas, respeitando-os nas suas singularidades e valorizando o potencial cada um.