Maria Susley Pereira
O Jornal do Senado Federal publicou no seu Portal de Notícias no último dia 21 de janeiro a matéria “Escolas podem ser obrigadas a oferecer reforço ao fim do 1º ciclo” . A publicação diz que “O aperfeiçoamento do sistema de ciclos da educação fundamental – modelo alternativo às series anuais que provoca muita polêmica desde sua criação em 1996 – é um dos temas que estão prontos para votação final dos senadores depois do recesso parlamentar. Segundo o Projeto de Lei do Senado (PLS) 414/2011, apresentado por Paulo Bauer (PSDB-SC), uma avaliação de Português e Matemática será obrigatória no final do 3º ano das escolas que adotaram a progressão continuada, com reforço pedagógico intensivo durante o 4º ano para os alunos com desempenho insatisfatório.”. O projeto, se aprovado, pode entrar em vigor no ano vem.
A mesma matéria diz que a organização da escolaridade em ciclos é um “sistema” muitas vezes “batizado de ‘aprovação automática’ e acusado de acobertar a queda da qualidade no ensino” e traz em três parágrafos as experiências do Rio de Janeiro e de São Paulo como exemplos de que “mudanças têm sido constantes onde os ciclos foram implantados.”
O que causa estranheza na matéria publicada é o fato de que a exigência de “mudanças” seja traduzida em uma política que determina a aplicação de exames externos como promessa de garantir o que não foi cumprido no decorrer de um tempo letivo e, mais estranho ainda, tornar lei que os alunos sejam submetidos a um “reforço pedagógico intensivo durante o 4º ano”. Ora, se estamos tratando de alunos inseridos em uma escola que se diz organizada em ciclos, não me parece adequado falarmos em “reforço” ao final de nenhuma etapa. Pelo contrário, uma das particularidades da escola em ciclos é justamente estruturar o trabalho pedagógico de maneira a possibilitar aos alunos que suas aprendizagens ocorram de forma contínua e sistemática, o que requer investir em estratégias didático-pedagógicas ao longo de todo o processo a fim de evitar que uns avancem e outros não. A escola em ciclos tem como concepção a progressão continuada das aprendizagens, o que nada tem a ver com “promoção automática” e sim com a perspectiva de que, como as pessoas possuem características diferentes e consequentemente necessidades de aprendizagens também diferentes, é preciso que a escola se organize a fim de favorecer os avanços de todos, por meio da reestruturação dos espaços e dos tempos escolares, enxergando cada aluno como responsabilidade de todos os envolvidos no processo educativo, o que significa dizer que mudar os tempos e os espaços na escola está intimamente ligado à organização de todo o trabalho pedagógico que precisa ser planejado para atender a cada aluno e não como um coletivo de pessoas que aprendem da mesma forma e no mesmo tempo. Ou seja, em uma escola em ciclos não se espera ao final do 4º ano ou de qualquer ano para se buscar estratégias que possibilitem aprendizagens; em uma escola verdadeiramente organizada na concepção dos ciclos os alunos não precisam ser submetidos a “reforço” – o que, inclusive, já os remete ao estigma de incapazes ou de defasados – pois lhes é proporcionado durante todo o percurso o ensino conforme suas reais necessidades.
Segundo o jornal, um dos esforços para que haja mudança no quadro atual da educação será com a “premiação aos bons professores e diretores de escola, punição para os eventuais negligentes.”, mas é preciso tomar cuidado com mudanças que sugerem premiações, pois estas são verdadeiras armadilhas. As mudanças precisam mesmo acontecer a fim evitar que continuemos a manter o percentual de 20% de reprovações no país e mais ainda que continuemos verificando que nossos alunos apresentem aprendizagens abaixo do esperado para cada ano/série, mas são mudanças no currículo, na estrutura da escola, na formação inicial e continuada dos professores e, principalmente, na avaliação.
O Senador Cristovam Buarque disse que “houve muitos equívocos na implantação do novo sistema”, então não é esse um excelente momento para evitarmos mais um?