Erisevelton Silva Lima – Doutor em educação pela UnB
Em diálogo com meus pares e em palestras habituais com os mesmos, a família tem sido apontada como um ente ausente, omisso ou desagregado que deixa de cumprir quesitos elementares para que a escola e os profissionais da educação consigam realizar o trabalho pedagógico. Onde estaria a cisão? Por que estas duas instituições estão distanciadas? Neste breve texto procuro discutir estas duas questões apontando a organização do trabalho pedagógico e, não por acaso, o envolvimento das famílias de maneira consultiva e colaborativa.
Para Tedesco (1998, p.36), essa erosão que afeta o apoio familiar não se limita à falta de tempo para auxiliar as crianças na realização das tarefas escolares (dever de casa) e ou para acompanhar a trajetória de aprendizagem dos estudantes durante o ano letivo. Aponta, ainda, que foi produzida ao longo dos tempos uma nova dissociação entre a família e a escola, qual seja: a debilidade nos quadros de referência para os quais a escola supõe sejam os corretos e para os quais ela se preparou. Acrescenta, ainda, o autor “A escola transformava a criança naqueles aspectos que fortaleciam a coesão social: adesão à nação, aceitação da disciplina e dos códigos de conduta etc.” (TEDESCO, 1998, p.37). Os quadros de referência apontados por Tedesco dizem respeito aos valores, especialmente aqueles pautados no reconhecimento das hierarquias que deviam ser sequenciadas e reforçadas fora de casa pela escola. A família modificou-se ao longo dos tempos, os valores parecem não apenas serem outros, mas se estabelecem de outras maneiras. Por outro lado, somos desafiados, diariamente, a pensar formas diferentes de organizar o trabalho e as relações no interior da escola.
Outro fator bastante interessante foi-nos trazido por Postman (1982), para quem a base da norma ou da moral na qual se erigiam os padrões de comportamento estava pautada na existência da infância que, por sua vez, era concebida como estágio da vida guiado pelo desconhecimento, pela intimidação e pelo sentimento de vergonha. Logo, o poder do adulto sobre a criança residia em saber “segredos” a que os pequeninos não tinham acesso. Para Tedesco (1998), o acesso à informação (especialmente por meio da TV), rendeu a quebra de tabus e mitos os quais não conseguem mais distanciar a infância da vida adulta, ou seja, por meio do acesso a tais verdades a infância se fez reduzida e a criança passa a igualar-se com aqueles que detinham os “segredos” de certas informações. Conversando com professoras e professores da educação infantil, eles reafirmam em meio a espantos que as crianças não são mais infantis e que elas argumentam e apresentam dados e comportamentos que não se aplicam ao conceito de criança e ao projeto pedagógico elaborado para elas.
Tais explicações procuraram responder às questões levantadas neste artigo. Contudo, o como ou a solução para a situação parece que não se apresenta por meio de um caminho único e automático inclusive porque o problema é um fenômeno para o qual certas respostas se desatualizam no percurso do seu retorno. O meu entendimento caminha na direção de que precisamos dialogar com as famílias, discutir o projeto da escola e inseri-las por meio da participação e não apenas da presença (LIMA, 2012) nas decisões da instituição. O contrato didático precisa ser realizado com os pais dos estudantes para que o comprometimento seja, verdadeiramente, bilateral. As famílias, nunca foi tão bem empregado o plural neste caso, são várias, diversas e plurais. O modelo tradicional foi rompido e não adianta ficarmos lamentando; as instituições estão cada vez mais se modificando diante do labirinto social em que estão inseridas, até a igreja tem conseguido acompanhar parte disso (vale lembrar a recente atuação e as palavras do Papa Francisco), contudo a escola resiste quando o assunto é sua ressignificação.
REFERÊNCIAS
LIMA, Erisevelton Silva. O Diretor e as avaliações praticadas na escola. Kiron, Brasília-DF, 2012.
POSTMAN, Neil. The disappearance of the childhood. NY, Vintage Books, 1982.
TEDESCO, Juan Carlos. O novo pacto educativo. Educação, Competitividade e Cidadania na sociedade moderna. Ática, São Paulo – SP, 1998.