MT: ADEUS AO EDUCADOR?

MT: adeus ao educador? – I

Publicado em 19/05/2016 por Luiz Carlos de Freitas no blog do Freitas

À medida que as Secretarias de Educação vão procurando a terceirização de gestão como solução para seus problemas econômicos, cresce também a necessidade de promover um aumento do número de professores disponíveis no mercado que, para sobreviver, aceitem a condição de serem empregados de escolas públicas com gestão terceirizada a baixo custo.

Estas organizações sociais precisam recrutar pessoas jovens, formadas em quaisquer carreiras universitárias, desempregadas ainda que momentaneamente, ambiciosas o suficiente para acreditar em suas promessas e que se disponham a trabalhar, enquanto não arrumam emprego melhor, pelo que estas escolas desejem pagar. Tais jovens serão qualificados rapidamente em cursinhos para serem professores.

No entanto, não serão as próprias operadoras charters ou terceirizadas que formarão estas pessoas e as Universidades demoram para formar profissionais capacitados e que, por serem bem formados, não aceitam facilmente tais condições. Hoje, já temos uma crise na formação de professores e com falta de professores os salários tendem a subir, algo que não está nos planos das operadoras de escolas terceirizadas.

Como ocorre em outros países, esta parte da formação tenderá a desenvolver uma outra indústria educacional, a de preparação rápida de profissionais para as escolas charters. Trata-se de uma cadeia produtiva que tem a terceirização da gestão como carro chefe e puxa a indústria da formação. As escolas com gestão terceirizada contratam pela CLT, sem estabilidade no emprego e podem pagar bônus.

Uma condição preponderante para tal é desacreditar a atual formação de professores e caracterizá-la como muito teórica e pouco prática. Sobre isso falarei em post seguinte.

Outra condição, uma vez criada a demanda de professores com a terceirização de gestão, é abrir espaço para as empresas de formação de professores se instalarem. E é isso que está acontecendo em Mato Grosso de forma simultânea: ao mesmo tempo que privatizam 76 escolas e 15 Cefapros, instalam uma corporação internacional ligada à indústria de formação de professores. No caso de MT já foi firmada parceria com a ONG internacional Teach for All que opera por aqui com o nome Ensina Brasil. Os Cefapros são Centros de Formação Profissionais espalhados pelo estado e se constituirão, provavelmente, em base de operação da Ensina Brasil.

Veja aqui sua filosofia.

Ela é um braço internacional da Teach for América que forma, nos Estados Unidos, professores em cursinhos rápidos. Aqui, eles estão falando em formar “agentes de transformação”, mas não está claro nos materiais que o Blog teve acesso como irão proceder, face à legislação existente.

O complemento necessário para esta “política” é a desprofissionalização da formação de professor. O primeiro passo é aligeirar a sua formação. Mas há pelo menos mais um: criar um sistema que permita que se forme professor em quaisquer entidades, inclusive nas ONGs. Daí se teria a associação ou não com um processo de certificação profissional (tudo depende das exigências, pois professores certificados podem ser mais caros), delegando-se a ele o controle de qualidade e a permissão de entrada na profissão. Documento do IPEA propôs recentemente que a Prova Nacional Docente em desenvolvimento no INEP, fosse este processo de certificação. Este cenário, no Brasil, está em construção e o seu formato final ainda está por ser definido pelo mercado educacional a ser criado.

A desprofissionalização exige ainda que exista um outro elo na cadeia produtiva que permitirá a formação aligeirada: a indústria dos sistemas de ensino. Com o aligeiramento, os professores precisarão de suporte de sistemas impressos ou on line que tenham todas as decisões mais relevantes em termos de conteúdos e métodos já dispostas. Convertem-se em seguidores de apostilas controlados por sistemas de gestão.

Para dar parâmetros para a indústria de formação e para a produção de sistemas operar em escala nacional, é necessário uma base nacional comum – tanto a curricular, como a de formação de professores – ambas em curso.

O modelo aplicado em MT é o da ONG Teach for América, que funciona em âmbito mundial com o nome de Teach for All e que no Brasil recebeu o nome de ENSINA BRASIL. A CEO da Teach for América e da Teach for All esteve no Brasil em 4 de maio passado.

As primeiras ações da Ensina no Brasil ocorreram ao que tudo indica no Rio de Janeiro, conforme denunciamos aqui no Blog em 2012. Atualmente, as informações apontam para um contrato da organização com o governo do Mato Grosso, ao qual se atribui o status de pioneirismo. Veja aqui.

A atuação destas organizações nos Estados Unidos tem mais de duas décadas e não resolveram em absoluto o problema por lá, conforme mostra o seguinte resumo:

  • O que sabemos agora sobre a Teach for America (TFA): a base de pesquisa crescente sobre a TFA revela um cenário misto, mas também mostra que a defesa da TFA é enganosa (ver também “três maiores mentiras”). Além disso, a TFA contribui negativamente para alguns problemas centrais que a educação pública enfrenta: evasão de professores; rotatividade do professor; e atribuição desigual de professores (alta pobreza e estudantes das minorias sendo atribuídos desproporcionalmente a professores novos e não certificados).Para finalizar, eis a recomendação de quem viveu durante 20 anos a depredação da Teach for América nos Estados Unidos:Precisamos de um corpo docente estável, não uma porta giratória. Nós precisamos recrutar novos professores, que planejem permanecer no ensino e fazer uma carreira. Os novos professores devem ter uma formação sólida e uma forte preparação para o trabalho. Eles devem ter mentores e o apoio que precisam para sobreviver aos julgamentos dos primeiros anos de vida e melhorar continuamente.”

 

  • Continua no próximo post.
  • “O problema com a TFA é que ela exagera grosseiramente o seu papel na educação americana. Este ano, a TFA enviou 8.000 jovens às escolas de alto risco; eles concordam em ficar lá por dois anos, alguns permanecem por mais tempo, mas a maioria terá desaparecido no prazo de três anos. (…)
  • Uma visão da recente crise educacional americana, depois de 25 anos de Teach for América, pode ser encontrada aqui. Como se verá na citada matéria, este não é um caminho para o Brasil trilhar.
 

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