PROFESSOR TEM MELHOR FORMAÇÃO NA REDE PÚBLICA DO QUE NA PARTICULAR

Professor tem formação melhor na rede pública do que na particular

Folha de São Paulo, 15/05/2016

Luiz Carlos Murauskas – 24.mar.2016/Folhapress
Pais participam de reunião no colégio Elvira Brandão, em São Paulo, para discutir o currículo

ÉRICA FRAGA DE SÃO PAULO

15/05/2016

Os professores da educação infantil e dos primeiros anos do ensino fundamental que lecionam na rede pública têm melhor formação teórica do que seus pares das escolas privadas.

Isso vale para duas métricas: percentual de docentes com ensino superior completo e com currículo adequado ao que a lei determina.

Formação universitária apropriada para lecionar no Brasil, porém, não é garantia de qualidade. O excesso de teoria nos cursos de pedagogia e licenciatura e a distância com a realidade escolar podem prejudicar o ensino.

Essas conclusões estão em um estudo inédito coordenado pelo acadêmico Fernando Abrucio, da FGV, para o movimento Todos pela Educação.

“Quem fez pedagogia no país estudou sobre educação, mas não é um profissional preparado para enfrentar a sala de aula. O mesmo vale para as licenciaturas”, diz Alejandra Velasco, superintendente da entidade.

Os dados revelam que, em 2014, a fatia de professores do ensino infantil (creches e pré-escola) na rede pública com nível superior completo e formação em pedagogia era, respectivamente, de 80% e 50%. Nas escolas privadas, esses percentuais atingiram 65,6% e 32,8%, respectivamente.

Esse hiato se repete nos primeiros anos do ensino fundamental, que vai do 1º ao 5º ano.

Nos dois ciclos mais avançados –últimos anos do fundamental e médio–, os indicadores de formação de professores tendem a ser melhores nas privadas, mas as públicas não ficam muito atrás.

Em todas as etapas da educação, em ambas as redes, a qualificação dos professores aumentou nos últimos anos. O estudo levanta a importância de entender o impacto desse progresso na qualidade da educação no Brasil, aquém do nível de países desenvolvidos.

Segundo Beatriz Ferraz, gerente de educação infantil da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, os cursos de pedagogia no país têm pouca proximidade com as necessidades das creches e pré-escolas.

Ela cita o estudo da pesquisadora Bernadete Gatti segundo o qual 82% dos cursos de pedagogia têm só uma disciplina de educação infantil.

Não há avaliação da qualidade da educação infantil. Em relação aos primeiros anos do ensino fundamental, a rede privada se sai melhor do que a pública nos exames.

Fatores como a escolaridade dos pais dos alunos têm um papel relevante nessa diferença. Mas, segundo Velasco, conta também o fato de que as particulares investem mais em formação continuada, o que ajuda a melhorar a prática escolar dos professores.

APOSENTADORIA

Em uma década, metade dos professores brasileiros do ensino básico terá idade igual ou superior à mínima para pendurar a chuteira, segundo dados levantados pelo movimento Todos pela Educação.

Como o tempo de serviço também é considerado no cálculo de tempo para a aposentadoria, pode ser que nem todos se afastem até lá. Mas haverá uma grande renovação do quadro docente do país nos próximos anos.

“Essa será uma oportunidade única para formar melhor nossos futuros professores. Se não a aproveitarmos, estaremos condenando o país a mais 20 anos de educação ruim”, diz o cientista político Fernando Abrucio, da FGV.

A pesquisa coordenada pelo acadêmico para o Todos pela Educação diagnostica problemas na formação de professores no Brasil e sugere medidas que podem ajudar a corrigi-los.

Para Abrucio, uma das mais urgentes é fortalecer a didática e a metodologia de ensino nos cursos de pedagogia e nas licenciaturas, consideradas em geral muito teóricas.

No estudo, ele menciona trabalho da pesquisadora Bernadete Gatti segundo o qual os próprios licenciados brasileiros afirmam que os cursos nas instituições privadas são baseados principalmente em apostilas com resumos de livros.

Outra medida importante, segundo Abrucio, é aumentar o peso da prática escolar, por meio dos estágios, nos cursos de formação.

ESTABILIDADE

O estudo também ressalta para os efeitos positivos da estabilidade do professor em uma mesma escola na aprendizagem dos alunos.

Os dados levantados pelo movimento indicam, no entanto, que nesse quesito a situação brasileira também deixa a desejar.

Quase 30% dos contratos dos professores na educação básica na rede pública em 2014 eram temporários.

“Professores que não são fixos costumam ter vínculos precários. Muitos não têm nem horário para planejamento das aulas”, diz Alejandra Velasco, superintendente do Todos pela Educação.

Além disso, embora 78% dos docentes lecionem em apenas uma escola, a rotatividade por estabelecimento no Brasil é alta.

O Inep (instituto ligado ao Ministério de Educação) calcula um indicador de regularidade do docente considerando sua atuação em uma mesma escola em cinco anos.

Análise do Todos pela Educação sobre esses dados indica que, em quase metade das escolas brasileiras, a regularidade dos docentes é baixa ou “média-baixa”. Estudantes mais pobres são os que mais sofrem com o troca-troca de professores.

DISPARIDADE REGIONAL

A pesquisa também aponta grandes disparidades regionais na formação dos docentes no Brasil.

No ensino básico como um todo, 58% dos professores tinham formação adequada à lei brasileira em 2014 (veja quadro nesta página). Esse índice, porém, variava de apenas 26% no Maranhão para 70,7% no Distrito Federal.

Segundo o estudo, o ensino à distância pode ajudar equilibrar as diferenças regionais, mas, para isso, é necessário melhorar a qualidade desses cursos.

 

 

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