JC Notícias – 04/06/2018
Roda de Matemática ensina crianças a amar a disciplina
O objetivo é ensinar a amar a Matemática e construir com ela uma relação positiva
Antes de apresentar o texto, insiro os aspectos que chamaram minha atenção e solicito aos leitores que reflitam sobre eles. Tenho observado que o Impa tem se preocupado com a aprendizagem da matemática, o que é louvável. Contudo, alguns pontos merecem análise.
Em primeiro lugar, é positiva a organização do trabalho pedagógico que não inclui aulas expositivas; elimina a percepção da matemática como bicho papão, criando relação saudável com esse componente curricular; introduz problemas desafiadores, mas acessíveis aos estudantes; promove atividades em grupos.
Contudo, em meio a tantas atividades enriquecedoras, por que a defesa de olimpíadas? Que papel têm cumprido? Quais estudantes são beneficiados por elas? Outras disciplinas também as estão promovendo. Não estarão elas ocupando um espaço muito grande? Por quê?
Outra afirmação inquietante é a que se segue: “A questão pedagógica tem papel relevante nos bons resultados da escola. O projeto reúne professores que falam de conceitos matemáticos interessantes e sofisticados para crianças desta faixa etária. Como precisam ter profundidade nos conceitos, geralmente são matemáticos, físicos, engenheiros ou profissionais de exatas e passaram por treinamento pedagógico diferenciado, embora haja pedagogos especializados na matéria”. Por que os professores que tratam de conceitos matemáticos interessantes e sofisticados são matemáticos, físicos, engenheiros ou profissionais de exatas, que passaram por treinamento? E os verdadeiros professores que se formaram em curso de licenciatura? Ao mesmo tempo que a roda de matemática quer eliminar a pecha de bicho papão que ela carrega, desvaloriza o profissional da educação devidamente preparado para atuar junto aos estudantes. Assim, os próprios matemáticos continuam ensinando que eles é que são os deuses. Os estudantes são espertos o suficiente para aprenderem a lição. “O objetivo é ensinar a amar a Matemática e construir com ela uma relação positiva”, desde que seja sob a orientação de matemáticos, físicos, engenheiros ou profissionais de exatas. É uma questão a ser revista.
Benigna Maria de Freitas Villas Boas
A seguir, o texto:
O lema de que é mais fácil aprender brincando vale para tudo na vida, até mesmo para a Matemática. Baseado neste pensamento, Gustavo Aleixo, Ligia Zorzo e Janaina Villela criaram há dois anos, em São Paulo (SP), a Roda de Matemática, escola para crianças de 5 a 12 anos, cujo objetivo é ensinar a amar a Matemática e construir com ela uma relação positiva.
Inspirada nos círculos matemáticos do Leste Europeu, onde havia encontros entre renomados matemáticos com jovens estudantes para troca de conhecimentos, a escola tem o formato um pouco diferente.
“Não temos aulas expositivas. Discutimos problemas matemáticos com grupos de até oito crianças. O objetivo é menos achar a solução da questão, mas, sim, quantas formas diferentes são possíveis para solucionar este problema”, conta Aleixo.
A opção pelo público de 5 a 12 anos é justamente para evitar que sejam “contaminados” pelo bicho papão que transforma a Matemática na inimiga número 1 dos estudantes. Para Aleixo e sócias, nesta faixa etária, o amor genuíno das crianças pela disciplina está latente.
“Entendemos que esta fase é o momento crítico para mostrar às crianças que a Matemática pode ser interessante, rica e flexível. Fazemos isso discutindo os problemas de forma bastante flexível e desenvolvendo raciocínio matemático.”
A Roda de Matemática tem como pilar o trabalho da professora inglesa Jo Boaler, da Universidade de Stanford. Para Boaler, não se deve enfatizar o erro da criança na resolução de um problema que ela desconhece, mas fazer com que tenha uma relação mais saudável com a Matemática, descobrindo haver diversos modos de chegar à solução.
O conteúdo das aulas se baseia especialmente na literatura dos círculos matemáticos, surgidos por volta de 1890/1900. “Os círculos têm a cultura de passar amor e interesse pela Matemática. Existe uma vasta bibliografia traduzida para o inglês na Universidade de Berkeley. Os problemas sempre têm uma abordagem interessante, desafiadora e acessível”, afirma Aleixo.
O fundador diz que os problemas da Roda de Matemática têm de ser desafiadores, mas não inacessíveis aos alunos. “Costumamos dizer, como Jo Boaler, que as questões precisam ter piso baixo, para que todos possam acessar, e teto alto, para que os alunos se sintam motivados a encontrar a solução.”
Cada encontro semanal dura mais ou menos uma hora e 20 minutos, tempo suficiente para discussão e aprofundamento dos temas. No período, as crianças resolvem de dois a três problemas. “Temos a visão de que a Matemática é uma das matérias das quais você tem mais recursos para apresentá-la de forma interessante. Infelizmente, muita gente não faz uso disso”, lamenta Aleixo.
Para ele, jogos matemáticos e olimpíadas de conhecimento como a OBM e a OBMEP são métodos eficazes para despertar o interesse dos estudantes, pois geram engajamento instantâneo e abrem espaço para mostrar várias ideias matemáticas de forma desafiadora.
A questão pedagógica tem papel relevante nos bons resultados da escola. O projeto reúne professores que falam de conceitos matemáticos interessantes e sofisticados para crianças desta faixa etária. Como precisam ter profundidade nos conceitos, geralmente são matemáticos, físicos, engenheiros ou profissionais de exatas e passaram por treinamento pedagógico diferenciado, embora haja pedagogos especializados na matéria.
Resultados
Aleixo brinca que, para saber se um encontro da Roda foi bom, basta observar quanto tempo os alunos gastaram discutindo entre eles em vez de apenas ouvir o professor. Se os alunos ficaram mais tempo debatendo, a aula foi um sucesso.
“A ideia é fazer com que os alunos se envolvam e encontrem entre eles as soluções, trabalhando em grupo. O objetivo é fazer com que eles aprendam Matemática fazendo Matemática.”
Nos dois anos, o projeto foi ganhando espaço no boca a boca dos pais. A Roda de Matemática já conta com cerca de 150 alunos semanais. Mais do que isso, o retorno de especialistas da área, diretores e consultores em Matemática têm agradado o trio de fundadores, cientes de estar no caminho certo para que cada vez mais crianças amem a Matemática.