Benigna Maria de Freitas Villas Boas
Durante apresentação oral para cerca de 500 professores dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio, no dia 8/10/2013, durante o II Congresso de Práticas Educacionais da Rede Pública do Estado de Minas Gerais, promovido pela MAGISTRA, Escola de Formação e Desenvolvimento Profissional de Educadores, no Hotel Canto da Siriema, em Minas Gerais, recebi dezenas de perguntas. Discuti com eles o seguinte tema – Portfólio: ampliando o debate entre professor e aluno. O tempo não foi suficiente para responder todas as perguntas. Como elas foram feitas por escrito, estou respondendo a cada uma, por este blog, para que eu possa atingir número maior de docentes. A pergunta acima, título deste texto, me foi enviada e parece ser uma das que mais inquietam os professores.
Os alunos aprendem na escola a conviver com notas e a estudar em função delas. Em seu livro A face oculta da escola, da Editora Artes Médicas, de 1989, Mariano Fernández Enguita afirma que “na escola aprende-se a estar constantemente preparado para ser medido, classificado e rotulado; a aceitar que todas as ações sejam suscetíveis de serem incorporadas a nosso registro pessoal; a aceitar ser objeto de avaliação e inclusive desejá-lo.” (p. 203). O autor comenta que, na escola, o aluno se submete a uma avaliação alheia, isto é, organizada sem a sua participação. As notas fazem parte desse processo. Após ficar muitos anos inserido nesse contexto, o aluno o aceita e até passa a desejá-lo, como diz Enguita.
O portfólio é um dos procedimentos de avaliação que podem romper com essa lógica tão opressiva, desde que os professores e a escola como um todo se fundamentem teoricamente e, em conjunto, organizem o processo avaliativo que o acolha.
Entendo ser difícil, no momento atual, eliminarmos notas. Como todos nós nos formamos em escolas que sempre as adotaram, para nós próprios não será fácil fazer com que elas percam o seu poder. Contudo, um bom início de mudança poderá ser darmos ênfase ao feedback e ao oferecimento de intervenções pedagógicas sempre que se fizerem necessárias. As notas poderão ser atribuídas ao final do processo, para que, aos poucos, sejam minimizadas e eliminadas. O portfólio contribui para isso porque ele apresenta evidências das aprendizagens dos alunos de modo que eles e os professores possam acompanhar todo o processo. Por ser construído pelos alunos, que têm a oportunidade de tomar decisões de várias ordens, ele transmite prazer pelo trabalho e difunde a ideia de pertencimento. Além disso, enquanto o portfólio é construído, o professor o analisa, dá orientações para que as produções sejam refeitas ou complementadas, o que dá segurança ao aluno quanto ao andamento das suas aprendizagens. Tudo isso faz com que os estudantes adquiram interesse por suas aprendizagens. A introdução dessas mudanças requer que toda a escola nela se envolva para que todos se sintam apoiados.
Atribuir nota ao portfólio o empobreceria porque o aluno empreende grande esforço para construí-lo. A nota poderia desmerecer todo o processo em que ele se envolveu. Como são utilizados outros procedimentos de avaliação além do portfólio, inclusive a prova, sugiro que a nota, quando for necessária, reflita todo o trabalho desenvolvido pelo aluno na disciplina. Reafirmo: para cada aluno é necessário deixar claro, constantemente, como se encontra em seu processo de aprendizagem.
PARA SABER MAIS
FREITAS, Luiz Carlos de et al. Avaliação educacional: caminhando pela contramão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009, 2ª ed.
VILLAS BOAS, Benigna M. de F. Portfólio, avaliação e trabalho pedagógico. Campinas, SP: Papirus, 2004.
VILLAS BOAS, Benigna M. de F. Virando a escola do avesso por meio da avaliação. Campinas, SP: Papirus, 2008.
VILLAS BOAS, Benigna M. de F. Projeto de intervenção na escola: mantendo as aprendizagens em dia. Campinas, SP: Papirus, 2010.
VILLAS BOAS, Benigna M. de F. (org.). Avaliação formativa: práticas inovadoras. Campinas, SP: Papirus, 2011.