SOBRE A CARTA DA ANPED EM REPÚDIO À AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA DAS HABILIDADES NÃO COGNITIVAS DE CRIANÇAS E JOVENS

Sobre a Carta da ANPED em repúdio à avaliação em larga escala das habilidades não cognitivas de crianças e jovens no Brasil

Maria Susley Pereira

 

Ao ler a Carta da ANPEd, fiquei me perguntando: o que “de fato” nosso sistema educacional espera alcançar com a implementação de mais um exame padronizado e, especialmente, esse tipo de prova? Fiquei me questionando também: em que medida nosso sistema de ensino tem se esforçado para que a escola tenha condições de cumprir sua função?

Afinal, o que se espera é que a escola, sabedora de sua função social e de seu papel na formação dos alunos, não se limite aos conteúdos curriculares, bem como tenha consciência de que a aprendizagem desses conteúdos não se faz de forma isolada e é intimamente relacionada ao desenvolvimento das chamadas “habilidades não cognitivas”. Saber conviver, ser cooperativo, crítico, consciente, curioso, saber lidar com as emoções etc. são elementos naturalmente esperados do trabalho da escola.

Estamos numa época em que os exames padronizados em larga escala são vistos como “o” caminho para o alcance da qualidade na educação, mas, retomando o questionamento da professora Claudia de Oliveira Fernandes da UFRJ (2011), “de que qualidade estamos falando”? Afinal, pensar na qualidade da educação é necessariamente pensar em uma escola que cumpre seu papel, que não exclui ninguém, que não deixa ninguém para trás, oportunizando a todos, igualmente, o direito de aprender e avançar nos conhecimentos, os quais são a base para que continuem avançando em sua escolaridade e que são, também, fundamentais para que se formem pessoas com condições plenas de cidadania.

Não se trata, portanto, de incluir na agenda educacional mais um exame, entre tantos já em curso no país e que são pouco ou quase nada compreendidos ou aproveitados para as aprendizagens dos alunos e que têm, em grande medida, contribuído apenas para a seleção. É preciso, então, expressiva cautela na proposição dessa “avaliação de habilidades não cognitivas”, considerando ser esta uma prova que pode ter efeitos ainda mais perigosos que os demais exames, porque relaciona-se com questões da personalidade, do psicológico… A mensuração desses aspectos em larga escala poderá ser fator de exposição e de estigmatização. Acredito que nossa educação não precise de mais um veículo para isso.

 

 

2 respostas para “SOBRE A CARTA DA ANPED EM REPÚDIO À AVALIAÇÃO EM LARGA ESCALA DAS HABILIDADES NÃO COGNITIVAS DE CRIANÇAS E JOVENS”

  1. Qual seria o impacto dos dados da avaliação de habilidades não cognitivas dos filhos/estudantes junto aos pais/responsáveis? Mais uma vez, acredito que se sentiriam avaliados por meio dos resultados obtidos pelos estudantes. E a reação das famílias? Como a escola iria interpretar esses resultados? Não adianta uma visão mercadológica da educação, se lidamos com pessoas que estão em constante processos de formação e de aprendizagens, sejam elas cognitivas, emocionais e psicológicas. O propósito dessa avaliação em larga escala em nada contribuirá para uma educação humanizadora, que defendemos por meio da avaliação formativa.
    Rose

     

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