Com o texto, a entidade reafirma suas reinvindicações junto ao CNE
A SBPC publica carta para manifestar sua preocupação com a iminente aprovação da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC-EM), pelo Conselho Nacional de Educação, sem levar em consideração as principais críticas e sugestões que foram apresentadas pela SBPC e por outras entidades científicas. “Queremos com essa carta reafirmar nossas reinvindicações que apresentamos ao CNE”, afirma Eduardo Mortimer, conselheiro da SBPC e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
“Não entendemos o açodamento do CNE em aprovar o texto num final de governo. Sabemos que o CNE sofre pressão, mas não entendemos essa pressa que vai impactar a reforma do Ensino Médio”, afirma. Mortimer lembra que no dia 28 de agosto a SBPC promoveu uma reunião em sua sede, que contou com a participação do presidente do CNE, de vários conselheiros do órgão e de 12 sociedades científicas, onde foram elencados alguns pontos importantes para a BNCC-EM. “E participamos ainda, em setembro (dia 14) de uma audiência pública para discutir o assunto, e lá entregamos o documento ‘A SBPC e a BNCC’. Deixamos claras as nossas sugestões”, comenta.
Mortimer explica que a SBPC considera que o CNE incorporou alguns pontos que haviam sido levantados nos documentos apresentados pela SBPC e pelas sociedades científicas, como, por exemplo, os relacionados à natureza das ciências experimentais, ligados à realização de investigações e ao uso da experimentação. “No entanto, a observância dos outros pontos é fundamental para garantir que a BNCC-EM cumpra seu papel de fornecer a base para o desenvolvimento de currículos de Ensino Médio compatíveis com as demandas da sociedade em relação à introdução da Física, Química e Biologia e ao desenvolvimento de Geografia, História, Filosofia e Sociologia”, ressalta.
Para o conselheiro da SBPC, a Reforma do Ensino Médio e a proposta da BNCC esconde debaixo do tapete o grande problema da carência de professores no ensino médio, principalmente nas áreas de física e química. “Uma vez que as escolas não são mais obrigadas a oferecer todos os itinerários, elas poderão simplesmente optar por não oferecer, por exemplo, Ciências da Natureza e suas Tecnologias, o que ‘resolve’ o problema da falta de professores nessa área”, comenta. “A Reforma do Ensino Médio é excludente porque não obriga a escola a oferecer todos os percursos formativos. Isso é uma tragédia. A BNCC precisa ser reformulada, com ampla discussão”, defendeu. Outro problema que ele aponta é que quando se solapa disciplinas de uma base, torna-se impraticável criar interdisciplinaridade sem que haja conhecimentos disciplinares.
Mortimer criticou ainda a abordagem multidisciplinar sugerida no novo projeto. “A proposta do MEC está muito superficial e os professores não conseguem identificar o que eles têm de fazer. Não há menção a nenhuma competência exclusivamente disciplinar, na BNCC, tanto na área de Ciências da Natureza e suas Tecnologias quanto na área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas”, explicou. Segundo ele essa é uma questão muito importante. “No Brasil, todos os cursos de formação de professores estão separados disciplinarmente”, ressalta.
Mortimer também ressalta que outro problema reside no fato de as diretrizes relativas a 60% de toda a carga horária prevista pela Reforma estabelecerem como obrigatórios apenas os componentes Português e Matemática. Disciplinas como História, Geografia, Química, Física, Filosofia e Artes aparecem agrupadas em “áreas do conhecimento”, como Linguagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias; e Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. “O texto estabelece de forma genérica itinerários formativos, mas não os conteúdos e práticas. Um ponto importante, e que pode gerar uma exclusão muito grande, é que as escolas não são obrigadas a oferecer todos os itinerários formativos”, afirma.
Leia a carta abaixo na íntegra:
Manifestação da SBPC frente à aprovação iminente da BNCC-EM sem acatar as sugestões que foram apresentadas
A SBPC vem a público manifestar sua preocupação com a iminente aprovação da Base Nacional Comum Curricular do Ensino Médio (BNCC-EM) pelo Conselho Nacional de Educação sem levar em consideração as principais críticas e sugestões que foram apresentadas pela SBPC e por outras entidades científicas, por ocasião da Audiência Pública realizada em Brasília em 14 de setembro de 2018. Além disso, o texto a ser aprovado não garante a oferta de todos os itinerários formativos, previstos na Reforma do Ensino Médio, aprovada em 2017, por todas as escolas ou, onde couber, por grupos distritais de escolas.
Há que se ressaltar que a SBPC tem procurado intervir no processo de elaboração da BNCC-EM, reivindicando ao MEC e ao CNE a realização de reuniões com a participação de sociedades científicas. Ao contrário do que ocorreu com o MEC, conseguíamos manter um bom diálogo com o CNE, como testemunha a reunião que foi realizada na sede da SBPC e contou com a participação do presidente do CNE, de vários conselheiros do órgão e de 12 sociedades científicas, além da SBPC. Nessa reunião, várias propostas das sociedades científicas e da SBPC tiveram por objetivo realçar o caráter disciplinar de uma proposta curricular para o Ensino Médio, sugerindo a inclusão de diversos pontos que resultariam nesse enfoque disciplinar para a BNCC-EM. A SBPC defende a interdisciplinaridade, mas entende que esta deve ter por base uma sólida formação disciplinar.
Frente a essas constatações, nos parece inadequado que o CNE queira aprovar, no final do governo, uma proposta de base para o currículo nacional que recebeu críticas incisivas da SBPC e de outras sociedades científicas.
Tomamos conhecimento da última versão da BNCC-EM em 29/11/2018, juntamente com a notícia de sua aprovação iminente na próxima semana e constatamos que não houve mudanças substanciais que contemplassem pelo menos 3 dos 4 itens que arrolamos naquele documento, a saber:
1) Argumentávamos que “inexiste, na atual BNCC do Ensino Médio, qualquer detalhamento de cada um dos cinco itinerários formativos previstos na Lei no 13.415 da Reforma do Ensino Médio (REM). A grande novidade da REM – um ensino médio diversificado – não é detalhada no documento da BNCC, o que, por si só, justificaria a devolução do documento ao MEC.” Isso, no entanto, não foi contemplado na nova versão e se continua sem saber que competências e habilidades compõem cada um dos itinerários formativos propostos.
2) Questionávamos que “a abordagem multidisciplinar sugerida no novo projeto não se coaduna com a demanda por ensino disciplinar nessa etapa da escolarização e com a formação tradicionalmente disciplinar do professor do Ensino Médio.” Argumentávamos que “a idade na qual os jovens chegam ao EM é a mais propícia à introdução das disciplinas científicas, como a Química, a Física e a Biologia. Isso se dá em todo o mundo e querer instalar a interdisciplinaridade, sem um mínimo de base disciplinar, é um risco que o Brasil não deve assumir.” E que “é muito pouco em termos de um programa mínimo de Física, Química e Biologia. O conjunto é muito fraco.” No entanto, a nova versão da BNCC continua a não mencionar nenhuma competência disciplinar, tanto na área de Ciências da Natureza e suas Tecnologias quanto na área de Ciências Humanas e Sociais Aplicadas.
3) Questionávamos, ainda, que “as DCN/EB organizam a escolaridade em disciplinas também no Ensino Médio e que também dispomos de uma legislação própria para os cursos de licenciatura recentemente aprovada pelo Conselho Pleno do CNE (Resolução No 2/2015), não há razoabilidade que o MEC priorize apenas as disciplinas de Português e de Matemática, colocando em risco a formação científica das futuras gerações de brasileiros.” No entanto, a nova versão da BNCC-EM continua a considerar que apenas Português e Matemática são disciplinas obrigatórias.
A SBPC considera que o CNE incorporou alguns pontos que haviam sido levantados nos documentos apresentados pela SBPC e pelas sociedades científicas, por exemplo, os relacionados à natureza das ciências experimentais, ligados à realização de investigações e ao uso da experimentação. No entanto, a observância dos outros pontos é fundamental para garantir que a BNCC-EM cumpra seu papel de fornecer a base para o desenvolvimento de currículos de Ensino Médio compatíveis com as demandas da sociedade em relação à introdução da Física, Química e Biologia e ao desenvolvimento de Geografia, História, Filosofia e Sociologia.